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Vá catar goiaba

Vá catá goiaba

Alguém talvez já esteja se perguntando: Por que crônicas só do Bairro da Fábrica, lugar aquele dos “metidos” de Caieiras? A explicação é simples. Existem sim muitos colunistas nascidos em Caieiras onde mais ela é conhecida como tal, pelas cercanias da Estação do Trem, esta, tendo o mesmo nome, e na Vila Cresciuma, hoje com o nome Centro de Caieiras. Mas, tais colunistas preferem expor os seus dons intelectuais nos jornais tidos como tendo maior circulação. “Historinhas” do passado eles consideram um despropósito escrever e preferem não perder tempo com elas mesmo tendo-as na memória. Para alguns, nós e nossos leitores talvez sejamos retrógrados por apreciar lembranças do passado que não volta mais. E por falar em passado...
No bairro da Fábrica (Xi... Outra vez esse lugar) onde proliferavam os pés de abacate, e em abundância eram também os pés de goiaba, a molecada tinha as suas responsabilidades diárias. Rodar pião, jogar malha, empinar papagaio, jogar bola e etc. Quando precisava me ausentar dessas incumbências trabalhistas, para obter licença e justificar a ausência eu conseguia um atestado médico com o Dr. Kotini (se é assim que se escreve). E lá ia eu com um amigo catar goiaba no mato e para isso levava um grande saco além do próprio. Que fartura de goiabeiras existia pelas matas daquela região! Estavam lá para o ‘bel prazer’ dos pássaros e para quem ousasse enfrentar cobras e lagartos, picão e carrapatos. Não demorava muito e já ficávamos com o saco cheio. Na volta pra casa desse sacrifício ecológico de catar goiaba o meu saco me atrapalhava. Repleto de goiaba quase até a boca (boca do saco) meu saco pesava muito. Às vezes me sentia aliviado quando encontrava alguém e esse alguém, solícito, levava meu saco pelas costas por um bom tempo.  Vez ou outra me encontrava com mulheres e pelo forte cheiro sabiam que eu tinha ido catar goiaba. Eu com o saco cheio e elas não se conformavam com o tamanho do meu saco. Algumas até queriam apalpá-lo e eu sentia muito prazer em deixar. O mesmo acontecia com o amigo que foi comigo. Daí, quando eu chegava em casa com as goiabas minha mãe quase desmaiava ao ver meu saco cheio, inchado e reclamava: menino sem juízo, exagerado, não vou conseguir fazer tanto doce de goiaba assim. Vá lá à casa da vizinha e mostre teu saco para ela que sei que ela gosta e difícil é mulher que não goste.  Menino obediente corria na casa da vizinha e lhe falava: Se a senhora gosta de goiaba pega aqui no meu saco. Agradecida ela falava: Menino bom, meu marido também catava goiaba. Saco ainda tem, mas, ele está meio velho e não usa mais. Daí eu voltava pra casa e a mãe já estava com as goiabas na caçarola ao fogo do fogão a lenha. Demorava um pouco e logo começavam a ferver e era preciso ficar mexendo pra não grudar, mas, não com colher de metal. Minha mãe sabia que meu pai tinha um pau grande bom para mexer e pedia para eu buscar. Eu falava pra minha mãe que eu também tinha um pau, mas, ela dizia que era muito pequeno. Então, com o pau do meu pai ela ficava mexendo bastante tempo. Aquela fervura fazia com que as goiabas dissolvidas borbulhassem e estourassem “puf, puf, puf”. Quando o doce ficava no ponto a mãe colocava-o numa grande tigela e demorava pra esfriar. Assim é que tínhamos doce de goiaba para vários dias. Mas, quem foi mesmo que comeu o doce ainda quente e ficou uma semana com disenteria, diarréia? É... Bons tempos que não voltam mais. Nesta época as crianças... Ah deixa pra lá.

                                                                                               Altino Olympio

 

N.R. Muita calma nessa hora, o velhinho tem 70 anos.....