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20/06/2008
A Torre Solitária


Fatos regionais do passado se tornam esquecidos como se nunca tivessem existido, mais ainda quando muitos de seus contemporâneos tenham falecidos. Na agora cidadezinha Caieiras dos Pinheirais, outrora como ainda agora e dentro dos domínios territoriais da Indústria Melhoramentos de Papel, a preponderância pertencia a duas espécies de arvores chamadas de “Pés de Pinhão e de Calipes” pelo povo local. As primeiras são as araucárias e as segundas são os eucaliptos. Existia e ainda existe um local chamado Horto Florestal, onde, mudas dessas árvores eram cultivadas para seus plantios como propósito para a fabricação de papel. Esse local teve seu nome extensivo para algumas moradias próximas a ele, pois, elas ficaram conhecidas como sendo Vila ou Bairro do Horto, onde também por muitos anos existiu uma pensão alimentícia que mais se destacava naquele recanto. Era parada obrigatória do trenzinho, que, vindo da primitiva Caieiras, nome esse antes só restrito aos locais das proximidades com a Estação Caieiras da antigamente chamada Estrada de Ferro Santos a Jundiaí, o trenzinho, depois do Bairro do Horto seguia para o Bairro do Monjolinho. O trenzinho foi desativado por volta do ano de 1950 e foi substituído por caminhões de passageiros apelidados de “pau-de-arara”.

Daquela conhecida Parada do Horto, perpendicular derivando dela já era o início de uma longa subida. Na esquina da esquerda era a cocheira dos cavalos puros-sangues da Industria Melhoramentos. À direita, a esquina era o cercado de uma moradia e logo depois dela era a entrada do já citado Horto Florestal com seus muitos canteiros de mudas. Passando por ele, a estradinha prosseguindo por entre araucárias e se tornando mais íngreme num longo trecho em reta até o seu cume onde, ele já era o início de uma também longa descida, trajeto este para o Bairro da Fábrica. Num espaço plano daquele alto existia uma alta torre construída com madeira, ou melhor, com toras redondas de árvores sobrepostas de baixo até em cima, onde, um espaço quadrado e coberto possibilitava ao derredor a visão mais abrangente para se localizar um possível incêndio nas matas da região. Esse era o objetivo da torre e lá tinha um telefone à manivela para algum alarme necessário.

Época da raridade de veículos particulares, os irmãos Olímpio na vanguarda daqueles tempos possuíam motocicletas. Num piquenique no platô onde estava a torre, meu tio Vitório Olimpio na sua moto com “barquinha” ao lado onde se instalou a tia Lucinda, se fez acompanhar pelo meu pai Alberto Olimpio com a sua tendo-me na garupa. Minha mãe Carmem, minha irmã Anita e poucas outras jovens que não ficaram retidas na memória, compareceram tendo caminhado a pé. A atração principal era mesmo a torre. Naquele sobe e desce pelas escadas internas dela éramos admoestados pelos “motopiqueniqueiros” sobre o perigo de algum acidente, pois, a mesma, já no abandono não oferecia segurança. E de fato, a torre se movia e rangia quando “assoprada” por fortes ventos. Também ela não escapou das superstições locais. Era tida como mal assombrada, talvez, para afugentar dela os garotos propensos a se acidentarem. Não tão logo depois daquele piquenique a torre foi demolida. Para a inocência de crianças no início de um mundo ainda a se descortinar foi uma lição. Tudo o que existe se transforma ou deixa de existir, como pessoas e como Caieiras antiga que agora é desaparecida. Quem quando criança teve uma torre na vida e do alto dela ter olhado distâncias, elas premeditavam uma infinidade de circunstâncias que iriam nos separar da infância.

Altino Olympio