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09/05/2012
Clima de velório

Todos nós, com certeza, já ouvimos causos, anedotas e piadas que circulam num velório. Apesar do clima reinante e do momento ser de tristeza, separação e perda irreparável, sempre há um gaiato que consegue ver o lado engraçado nesta ocasião.
A palidez do personagem principal, o algodão nas narinas, e uma tiara amarrada no queixo cruzando a cabeça, compunham um cenário traumático e assustador para minha tenra idade. Era medo para mais de um ano!  Ainda bem que cresci e hoje passei a temer os vivos.
Muitas vezes viajei do sítio até o cemitério junto a um desencarnado na carroceria do caminhão. E ai se esse caixão desse um escorregãozinho pro meu lado, devido aos solavancos das estradas esburacadas! Sabe o que aconteceria? Nem eu, pois no mínimo acharia que o infeliz havia me escolhido para lhe fazer companhia.
Existem vários tipos de freqüentadores de velório. Tem aqueles que só dão uma passadinha, para marcar presença, até ser notado pelo dono do morto. Este tipo fica de longe observando o melhor momento de cair fora, mas com a sensação do dever cumprido.
E o que dizer dos curiosos? Vão conferir se tinha bastante gente, quem estava presente e reparar a fisionomia do falecido -, e ainda sair falando se ele estava com boa fisionomia e bem vestido.  Outros vão para contar as coroas de flores recebidas e com isso se certificarem o quão querido ou importante era o finado. 
Tem até aquele que vai para observar quem mais chorou na hora do adeus. Alguns são tão viciados em velórios, que perto de fechar o caixão, aproximam-se para ter chance de pegar numa das alças e mostrar serviço.  Aqueles que ficam de longe e preferem a rodinha de piadas, provavelmente por medo - também marcam presença.
Os proseadores de plantão passam o tempo todo fazendo uma reprise da vida do falecido, contando cada detalhe da sua vida pregressa. Talvez seja esta uma maneira de aliviar o estresse da passagem, ou uma forma de encurtar o tempo de angústia. Paciência mesmo precisa ter os parentes mais próximos, para contarem repetidas vezes, como ocorreu a morte e a agonia do ente, antes da partida. Tem aqueles que fazem do evento uma festa para rever velhos amigos. Como se diz: para rever os parentes só mesmo nos velório e casamentos!
Piadas sobre velório têm aos montes.  Aqui vai uma clássica: três genros um mais gozador que o outro, colocaram os presentes, que a sogra mais gostava, junto ao seu corpo - no caixão. Um botou rosas vermelhas, o outro perfume e o terceiro cigarros. Aí o mais gozador dos três disse ao que colocou os cigarros: - não se esqueça do isqueiro, ela poderá precisar! Ele responde: - fique frio, pra onde ela está indo, tem fogo pra caramba!
Os poetas até conseguem fazer trovas neste triste momento, como foi o caso do esposo da falecida, que cobrado pelos filhos, para dizer algo na hora da despedida da mãe, emendou: Senhor, desejo que receba minha esposa, com a mesma alegria que me mandou! O romântico diz: até as flores tem diferentes sortes, umas enfeitam a vida, outras enfeitam a morte!
Bêbado em velório é vexame na certa! Em um deles, onde só tinha uma pobre velhinha choramingando a perda do filho, o bebum pergunta: - Qual foi a causa da morte dona? A velhinha responde: - morreu como um passarinho! Ao sair, seu amigo que estava sentado na sarjeta indaga-o: - do que morreu? E ele sem pestanejar, responde: - Alpiste envenenado ou estilingada!
Genro ingrato também faz parte do folclore dos velórios. Tem aquele que assim que enterrou a sogra, por sinal uma jararaca, saiu em disparada para comemorar com os amigos numa churrascada  mas, ao passar por dentro de um prédio em construção caiu um tijolo de oito furos rente ao seu corpo, espatifando - se no chão, e ele emendou: velha desgraçada, já chegou aí em cima?
Como diz lá na roça: velório bom tem que ter fartura! Em muitos deles servem arroz carreteiro, xipa e de madrugada corre até canja de galinha! Eu já fui num que teve churrasco, cachaça e dupla sertaneja. Segundo os parentes, este era o desejo do finado, sendo a música Boate Azul sua preferida. Imaginem quantas vezes foi tocada? Assim seja!
E VIVA A VIDA NO VELÓRIO!
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Osvaldo Piccinin