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28/08/2012
Investidor estrangeiro vê o Brasil com cautela

Apesar disso, Sam Zell afirma que ainda existem boas oportunidades no País, inclusive no setor imobiliário

Apesar da desaceleração da economia, o Brasil ainda tem boas oportunidades para investimentos, principalmente em setores ligados ao consumo, avalia o megainvestidor americano Sam Zell, da Equity International. Durante visita à capital paulista nesta semana, o investidor falou à Agência Estado. Ele não revelou o motivo de sua vinda ao Brasil, mas foi enfático ao afirmar que tem apetite por novos negócios no País. "Nunca deixamos de ter interesse, só estamos mais cautelosos", disse, referindo-se ao ambiente de crise internacional.
Sam Zell, de 70 anos, já teve participações em empresas brasileiras do setor imobiliário, como BrMalls, Bracor, Gafisa e BRFE, das quais se desfez. Atualmente, seus investimentos no Brasil incluem Grupo Thá (construtora, incorporadora e rede de imobiliárias de Curitiba), Guarde Aqui (armazenagem feita por conta própria) e AGV logística.
Sua movimentação mais emblemática ocorreu em 2010, quando deixou a Gafisa na hora certa. De lá para cá, a incorporadora perdeu cerca de 80% do valor de mercado em meio a problemas como atrasos de obras e descontrole de custos. Neste começo de ano, ele quis voltar para a Gafisa, mas sua proposta foi recusada pela gestão da companhia. Segundo fontes do mercado, Sam Zell se dispunha a pagar cerca de R$ 1 bilhão pela Gafisa e pela Tenda (braço de imóveis econômicos). A seguir, os principais trechos da entrevista com o investidor.
Como o Brasil tem sido visto pelos investidores estrangeiros neste momento em que a economia está desacelerando?
A dúvida é se essa desaceleração já acabou ou não. Há opiniões diferentes sobre isso, mas de maneira geral, os investidores estrangeiros veem o Brasil e os outros mercados emergentes com cautela. Hoje, os emergentes enfrentam muitos obstáculos, muita resistência.
O mercado imobiliário ainda tem boas oportunidades?
A pergunta principal é se o Brasil ainda tem boas oportunidades. Na minha opinião, a resposta é sim. O País tem muito potencial. No setor imobiliário, nunca deixamos de ter interesse, só estamos mais cautelosos.
Qual o perfil das companhias com potencial de crescimento?
Esse perfil tem ligação direta com a situação econômica do País. A população continua a crescer, assim como o movimento de ascensão para a classe média. Isso claramente indica que o setor imobiliário terá demanda para a construção de casas e para atender ao varejo. O setor de hotéis também é bastante promissor.
Há sinais de bolha no setor imobiliário brasileiro?
Não sou um expert nessa área, mas acho que, se tivéssemos uma bolha, é mais provável que ela se desinflasse lentamente. O setor de moradias ainda oferece um bom valor no Brasil, apesar dos preços altos.
O que deu errado com as incorporadoras?

A maioria enfrenta problemas como atraso de obras e estouro nos orçamentos.
Em alguns casos, isso é resultado de incompetência. Em outros, o problema dos custos é resultado do ambiente de inflação na construção, que é maior que em outros setores. Eu não acredito que o que está acontecendo no Brasil seja diferente de outras partes do mundo.
No Brasil, muitas incorporadoras perderam mais da metade do valor em dois anos. Seria o momento ideal para investir nelas?
O fato de elas terem perdido mais da metade do valor de mercado é muito expressivo. Apesar disso, vale lembrar que, nos últimos seis anos, a receita dessas companhias cresceu duas ou três vezes. Como elas dobram de tamanho, fica difícil afirmar que a situação foi um desastre. Eu acredito que elas estavam sobrevalorizadas antes, mas não sabemos se estão subvalorizadas atualmente.
Quais foram os principais motivos para deixar a Gafisa?
Nossa saída da Gafisa foi uma decisão normal de investimento. Entramos em 2005 e saímos definitivamente em 2011. Todo fundo tem um prazo para ser encerrado, pois é nossa responsabilidade dar o retorno de capital para os sócios.
Do que a Gafisa precisa para ser rentável novamente?
Acho que a Gafisa precisa de um acionista controlador. Quando a Gafisa teve um controlador, com a Equity International e a GP Investments, nós monitoramos a companhia e mantivemos o controle. Quando saímos, a Gafisa se tornou uma companhia sem dono.
O senhor tem algum interesse em negócios ligados à Copa do Mundo e à Olimpíada no Brasil?
Não. Os Jogos Olímpicos duram menos de duas semanas. Quem vai construir um hotel para duas semanas? Alguém vai, mas eu não. A Copa e a Olimpíada são coisas maravilhosas que estão acontecendo para o Brasil, mas isso vai custar para o seu País uma fortuna. Vocês ficarão muito orgulhosos, mas vão passar muito tempo pagando. Olhe o exemplo de Montreal. Eles demoraram 35 anos para pagar os jogos.


CIRCE BONATELLI, ANGELO IKEDA - O Estado de S.Paulo