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17/12/2012
Ainda sem respostas

Já se vão quatro anos desde que o Lehman Brothers quebrou e a grande crise global do início do século 21 entrou para a História. Nesse período, as ações e experimentos de política econômica testados não produziram resultados capazes de configurar a superação dos problemas e a reversão das consequências de um ciclo de baixo crescimento.
Concentrados na política monetária e no ativismo dos bancos centrais, os caminhos adotados revelam, com crescente e angustiante nitidez, avanços limitados e insatisfatórios. Difícil negar que, se foram capazes de evitar uma depressão de grandes proporções, nos moldes da ocorrida pós-crash de 1930, ainda não apontam para um horizonte de retomada sustentável do nível de atividade e, principalmente, do emprego.
Em resumo, recessão ou estagnação, refletindo taxas de desemprego alarmantes, é o que se tem para contabilizar, em meio a previsões de muito anos mais nessa situação. Sem falar na contaminação negativa que, aos poucos, acabou atingindo as principais economias emergentes e, em especial, a chinesa.
O quadro geral continua preocupante e essa preocupação aumenta quando se constata que as ideias econômicas das quais derivam as políticas em execução não parecem dispor das respostas aos desafios trazidos pela crise de 2008. O pior é que as teorias divergentes ou antagônicas conhecidas também não conseguem apresentar um rol de saídas convincentes.
Esse é o cenário sombrio pintado pelo economista André Lara Resende, em interessantíssimo artigo publicado, semana passada, no jornal “Valor”, sob o título “Nova realidade, velhas questões” (http://migre.me/bAQPh). Ex-diretor do Banco Central brasileiro e sempre lembrado como um dos “pais” do Plano Real, Resende é um pensador original da economia. No artigo, ele descreve a encruzilhada em que a crise global jogou o conhecimento macroeconômico contemporâneo.
Resende lembra, por exemplo, que o “quantitative easing” (QE), aplicado pelo Federal Reserve americano, não é um experimento pioneiro, já tendo sido aplicado, sem sucesso, no começo da primeira década deste século, numa economia japonesa até hoje estagnada. O QE americano seria uma espécie de reedição da experiência japonesa e, como ela, baseada nos pressupostos da velha – e, segundo Resende, ultrapassada – teoria quantitativa da moeda, base do monetarismo clássico.
Como instrumento para tirar a economia da estagnação, de acordo com Resende, os QEs, nos tempos atuais, são, na melhor das hipóteses, inócuos. Entre outros motivos porque a atuação dos bancos centrais, ao evitar uma depressão econômica como a registrada nos anos 30, impediu que as dívidas fossem pulverizadas pela quebradeira geral que costuma acompanhar as depressões.
Esse mesmo motivo – a permanência de um endividamento excessivo, primeiro do setor privado e depois transferido para o setor público – também tiraria a eventual eficácia de uma política keynesiana pura, como a defendida por Paul Krugman, Prêmio Nobel hoje ativo colunista do jornal “The New York Times”. Se as dívidas persistem altas, argumenta Resende, um aumento de renda promovido pela expansão fiscal será pelo menos em parte poupado, enfraquecendo o impulso fiscal. Além disso, se a dívida pública já é percebida como excessivamente alta, o necessário aumento do déficit público, implícito na receita keynesiana clássica de expandir gastos públicos, lançaria desconfianças sobre a solvência dessa dívida.
Finalmente, a política monetária neokeynesiana, que sucedeu o monetarismo clássico, a partir dos anos 90, redirecionando a atuação dos bancos centrais do controle da base monetária para políticas de juros e metas de inflação, opera em terreno de extrema incerteza quando as taxas reais de juros adentram o terreno negativo, como ocorre hoje nas economias maduras em crise. Para Resende, os efeitos positivos de reduções de juros reais sobre a demanda agregada não se repetem e não seguem a mesma lógica verificada quando os juros reais se tornam negativos.
Na experiência histórica, impasses dessa natureza, em algum momento, a partir de esforços de negação dos conceitos vigentes e da superação de naturais resistências a mudanças, acabam produzindo novas soluções adequadas aos novos tempos. Mas, na crise atual, por enquanto, o que se tem é, simplesmente, uma regressão a antigos debates, que pareciam superados. E o aumento da frequência de uma indagação: não se está exigindo mais do que a política monetária e os bancos centrais sozinhos podem entregar?


José Paulo Kupfer – O Estado de São Paulo