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18/09/2013
As boas ideias não são só dos superdotados

As pessoas são mais criativas quando trabalham dentro dos limites do que elas já sabem

Analogias malucas e distantes oferecem pouco ao processo criativo; às vezes, pensar dentro da caixa é a melhor opção

Quando o dirigente de uma empresa ouve a palavra "inovação", em geral ele suspira com impaciência.

Durante os últimos dez anos, entrevistamos executivos de todos os principais setores da economia e apresentamos duas perguntas importantes sobre inovação. A primeira: "Numa escala de 1 a 10, qual a importância da inovação para o sucesso de sua empresa?" A segunda: "Numa escala de 1 a 10, até que ponto você está satisfeito com o nível de inovação na sua empresa?"

Os participantes dão uma nota muito alta para a importância da inovação: em geral 9 ou 10. Ninguém duvida que ela seja o fator número 1 para o crescimento de uma empresa. Mas a maioria dá nota baixa para o seu nível de satisfação com a inovação.

Como pode um dirigente dar tanta importância à inovação e, ao mesmo tempo, sentir-se tão insatisfeito com o desempenho da sua firma? Porque o que eles querem saber é o "como". Como gerar novas ideias na prática e de forma consistente?

A visão tradicional diz que a criatividade é desestruturada, sem regras ou padrões. Quem quer inovar precisa "pensar fora da caixa", "começar com um problema e fazer brainstorming de ideias para uma solução" ou "fazer analogias malucas com coisas que não têm nada a ver com o seu produto ou serviço".

Nós defendemos uma abordagem radicalmente diferente: pensar "dentro" da famosa caixa. As pessoas estimulam ao máximo sua criatividade quando se concentram nos aspectos internos da situação ou problema — e quando restringem as opções.

Nosso método consiste em considerar um produto, conceito, situação, serviço ou processo e dividi-lo em componentes ou atributos. Usando uma das cinco técnicas abaixo, o inovador pode manipular os componentes para criar ideias totalmente novas.

As cinco técnicas são:

Subtração: Retirar elementos aparentemente essenciais.

Pense numa lente de contato, uma bicicleta ergométrica, um caixa eletrônico. O que eles têm em comum? Todos resultaram da eliminação de alguma coisa. Elimine a moldura de um par de óculos e aí teremos a lente de contato. Retire a roda traseira de uma bicicleta e está inventada a bicicleta ergométrica. Elimine o funcionário do banco de uma transação monetária e teremos um caixa eletrônico.

O Walkman da Sony era um gravador de cassete sem a função de gravação. E até mesmo Akio Morita, presidente do conselho da Sony e inventor do Walkman, ficou surpreso com a recepção entusiástica do mercado.

Unificação de tarefas: Unir funções não relacionadas.

Samsonite, a maior fabricante mundial de malas, usou a unificação de tarefas para entrar no mercado de mochilas para universitários. As mochilas causam tensão nas costas e no pescoço, devido ao peso do conteúdo: livros, laptops, etc.

A equipe da Samsonite criou uma maneira de usar o peso para beneficiar o usuário. As alças têm um formato que pressiona suavemente os ombros em pontos de shiatsu estrategicamente localizados, proporcionando uma sensação de massagem.

Ou pense no sistema Captcha (acrônimo em inglês para Teste de Turing Completamente Automatizado para Distinguir um Computador de uma Pessoa). É esse programa de segurança que pede ao usuário que digite uma palavra escrita com letras estranhas e distorcidas para liberar o acesso a um site.

O que a maioria das pessoas não percebe é que suas respostas para o Captcha servem para dois propósitos. Além de provar ao site que quem está digitando não é uma máquina, os usuários do Captcha estão decifrando palavras de textos impressos difíceis de ler. O inventor do sistema, um cientista da computação da Universidade Carnegie Mellon, no Estado americano de Pensilvânia, percebeu que, alimentando o Captcha com palavras que um scanner não consegue "ler" ou interpretar como palavra, os usuários podem ajudar na gigantesca tarefa de transformar conteúdos impressos em formato digital. Assim, internautas estão ajudando a transcrever quase 150.000 livros por ano.

Multiplicação: Copiar um componente e modificá-lo.

Pense na lâmina de barbear. Em 1971, a Gillette lançou o Trac II, o primeiro sistema de barbear de lâmina dupla. Com isso se pode barbear mais rente, pois a primeira lâmina puxa o fio de barba, e antes que este se retraia, a segunda lâmina o corta.

Divisão: Separar os componentes de um produto ou serviço e reorganizá-los de outra maneira mais eficiente.

Há muitos exemplos dessa técnica, desde o check-in de um voo, que agora permite ao usuário imprimir o cartão de embarque em casa, até o controle remoto da TV, cujas funções antes ficavam no próprio televisor. A Johnson & Johnson usou a técnica da divisão para reformular um programa de treinamento para vendedores de produtos médicos. O conteúdo do curso foi dividido em partes menores e estas foram então reorganizadas em função de doenças e problemas específicos. Isso reduziu drasticamente o tempo necessário para treinar um vendedor para um novo produto médico.

Codependência de atributos: Modificar os atributos de um produto em resposta a mudanças em outro atributo ou no ambiente.

Um excelente exemplo dessa técnica são os óculos com lentes que escurecem quando expostas ao sol. Outro exemplo é o limpador de para-brisa que acelera quando a chuva aumenta.

Alguns exemplos dessa técnica já existem há tanto tempo que já não parecem tão criativos. Isso vale em especial nas questões de preço. Veja, por exemplo, programas de fidelização que oferecem descontos aos clientes antigos ou segundo o número de amigos que o cliente recomenda. Ambos fazem uma variável depender da outra.

Usar uma dessas técnicas do tipo "dentro da caixa", ou todas elas, implica em treinar novamente a forma como o cérebro pensa para resolver problemas. A maioria das pessoas julga que a inovação começa definindo bem um problema e em seguida pensando nas soluções. Nosso método é oposto: pensamos em uma solução abstrata, conceitual e encontramos um problema que ela possa resolver.

O segredo da inovação contínua é criar uma nova fórmula para algo conhecido e então encontrar uma função que ela possa desempenhar. É por isso que, ao ouvir pela primeira vez uma nova ideia, muitas vezes a pessoa se decepciona: "Puxa, mas por que eu não pensei nisso?" Muitas vezes as melhores ideias estão bem debaixo do nariz.

Uma invenção pode ser extraordinária, mas inventar não é um fato extraordinário. E a criatividade não é exclusiva dos talentosos e superdotados. Ela pode ser aprendida por todos.

Adaptado de "Inside the Box: A Proven System of Creativity for Breakthrough Results", recém-lançado pela Simon & Schuster. Boyd, ex-executivo da Johnson & Johnson, é professor assistente de marketing e inovação da Universidade de Cincinnati, em Ohio. Goldenberg é professor de marketing da Faculdade de Administração da Universidade Hebraica de Jerusalém, em Israel.

 


Por DREW BOYD e JACOB GOLDENBERG – Wall Street Journal