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02/03/2017
A casa no Bonsucesso

Esta era a casa onde morávamos no Bonsucesso (a casa pertencia a Cia Melhoramentos de São Paulo).

Embora não tivéssemos energia elétrica possuíamos um vasto quintal. Se observa nesta foto minha inesquecível avó paterna, Tereza Valentim Menuchi, quase tateando suas mãos em um enorme suíno, mais ao fundo duas cabras (o fortíssimo leite que contribui com a saúde dos ossos, sendo rico em cálcio). Tínhamos também criação de coelhos e aves, canteiros com as mais variadas hortaliças e leguminosas. Recordo que sem energia elétrica fazíamos um enorme buraco para refrescar cervejas e refrigerantes.

Assim os anos se passaram rapidamente em minha infância. Porém faz-me lembrar de minha amorosa avó paterna, Tereza Valentim Menuchi, seus braços fortes e aconchegantes, contribuindo com o progresso deste generoso Brasil, principalmente em substituição aos escravos recentemente libertos, sendo uma mão-de-obra importantíssima na colheita do café. Não acho que os italianos escolheram o Brasil, mas São Paulo escolheu os italianos.

Vivíamos cordatos com nossos vizinhos, entretanto tivemos uma questiúncula com eles (parece-me que uma das cabras subiu o telhado de um barracão quebrando suas telhas), que exaustivamente tentamos conciliar no campo amigável e debalde foram os esforços (Jean-Jacques Rousseau dizia: "A natureza fez o homem feliz e bom, mas a sociedade deprava-o e torna-o miserável.”) Entrando no litigioso, obtivemos uma decisão favorável no processo que minha avó indignada e inconformada ao tomar conhecimento da sentença foi mais ou menos assim relatada em seu idioma mãe:

Questo giudice dovrebbe scrivere con semplicità e chiarezza, non capisco quasi nulla, caspita.( em tradução livre – Ela desejava que a sentença do juiz fosse clara e simples que as partes não tivessem dificuldades em entender a decisão ocorrida.

Em minha vida acadêmica e profissional (mormente no serviço público federal em decorrência da lotação em um dos mais importante ministério da República) deparei muitas vezes em processos, sentenças às avessas, acacianas. Frases empoladas, de efeito, mas de pouco ou nenhum sentido.

A sentença é dirigida ao povo e este deve entendê-la. A boa linguagem, a propriedade das expressões guardando a exata conformidade com a ideia, é o bom segredo para a lavra da sentença. A simplicidade do vernáculo é necessária – facilita o entendimento.

A solução dada por uma autoridade deve ser de forma simplória e elegante na linguagem, deixando aos interessados que leem imenso sabor de aprender.

Depois de muitas décadas revendo meus apontamentos encontrei uma “pérola” que transcrevo:

Um eminente jurista ao retornar á casa, após laborioso dia, surpreendeu um ladrão furtando um frango do seu galinheiro. Enfrentando o gatuno, disse:

-Como ousas penetrar os umbrais da minha residência, para subtrair-me? Se for por mera ignorância e não pelo valor intrínseco de um galináceo, perdoar-te-ei; mas, se for para zombar da minha alta prosopopeia, juro-te que que com as matações dos meus borzeguins pisarei sua massa encefálica e reduzir-te-ei a cinzas cadavéricas.

O ladrão, com o frango ainda sob o braço, olhou com os olhos arregalados e perguntou:

- Doutor, como é que fica; vou levar, ou não, o frango?

O fato narrado diz bem da inutilidade da arenga enrolada com verdadeiro bordado, obrigando o leitor ao martírio de um texto burocrático, e geralmente pomposo ou em estado de verborragia.

ANÍZIO MENUCHI

A foto da casa está disponível no linkhttp://www.caieiraspress.com.br/fotos

/index.php?id=2

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