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21/07/2017
As noites dos ricos

Fala-se muito de justiça divina, mas, pelo que constatamos da miséria que existe no mundo, com muita gente tendo muita dificuldade para se alimentar enquanto outros vivem de fartura, só podemos supor que tal justiça só possa mesmo existir em algum lugar oculto e inacessível para os seres humanos que ainda estão vivos. Depois de vivermos poderemos saber donde ele se localiza para então sermos felizes com uma justiça real e perfeita para todos, muito melhor do que a justiça imperfeita humana. Eu já me encontro ansioso para ficar desfeito e ser elevado a esse lugar sublime.

A vida dos ricos seria bem mais invejável se os pobres tivessem mesmo consciência constante das disparidades entre eles. Mas, eles, prisioneiros de seus destinos, nem tempo eles têm para refletirem sobre isso. Suas vidas são como um martírio diário para poderem sobreviver e abastecer suas famílias. Trabalham e trabalham por muitos anos e ao final quando já estão velhos, para viverem ficam dependendo das migalhas da previdência social do governo. Se eles pudessem xeretar como vivem os ricos... Hoje mesmo por causa de um compromisso precisei seguir por um trajeto entre ruas e bairros onde a pobreza é alarmante. Sem entrar em detalhes, sempre me deparo com pobres em suas sinas diárias, mas, nunca me deparo com ricos, até parece que eles não existem.

Ricos sim são os que têm os melhores entretenimentos. Numa mansão houve o maior primor para receber os convidados para uma festa. Homens e mulheres da mais alta sociedade compareceram. Seus trajares até eram exorbitantes. Lá também esteve um rapaz inebriado com aquele ambiente. Devido algum exagero pelo que consumiu de quitutes e da refeição tão requintada ele se viu na necessidade de ir ao banheiro. Não conseguiu porque sempre todos os banheiros já estavam ocupados. A situação dele foi cada vez mais se tornando insuportável. Ocultamente retirou-se da festa e se dirigiu ao jardim daquela mansão. Lá, sobre o verde da grama e rodeado por lindas flores, às escondidas ele se aliviou do que interiormente o importunava. Mas, quis olhar para o que tinha despejado e não viu nada.

Que estranho, pensou. Eu me aliviei sim, com certeza. Olhou mais atentamente, procurou e procurou e nada encontrou. Será que tudo tão estranho foi causado pela embriaguês? Poderia ter sido sim e assim pensando naquele fato incógnito ele retornou para a festa. E naquele transcorrer entre música suave, bebidas finas e as conversas intelectuais entre os convidados a noite tranquilamente terminou para dar vez ao sol da manhã com todo o seu esplendor. Aquele rapaz ainda inebriado com aquele ambiente para os privilegiados pela vida foi o último a sair daquela mansão. Já estava esquecido daquela sua incógnita da madruga e ao ver um senhor muito simples no jardim, o jardineiro, e ele querendo demonstrar simpatia com o próximo, sorridente cumprimentou aquele senhor:

--Olá, Bom-dia, lindo dia, não?

--Bom-dia uma ova. Se eu visse o FDP que cagou em cima da tartaruga eu o mataria. Coitada, ela já é bem velha e doente e teve que ficar andando pra cá e prá lá com aquele peso fedido sobre ela.

--Ah é? Nossa! Quem teria feito essa maldade e...

Na revolta do jardineiro ficou desfeita a incógnita vivida pelo rapaz durante a madrugada. Ainda bem que aquele caso insólito teve solução para ele. Com ou sem tartaruga as noites dos ricos são muito mais elegantes e deliciosas do que as noites dos pobres. Para estes as noites só servem para eles dormirem e para se esquecerem de suas rotinas diárias e enfadonhas.

 

Altino Olympio