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12/01/2019
A cura da Gagueira

Gago que sou , vivi situações patéticas , hilariantes , degradantes , singelas até na busca incessante pela minha cura .

Ser gago em muito me atrapalhou na minha vida normal e profissional . Sempre fui motivo de chacotas , tiradas , gozações mas sempre relevei e sempre aceitei participando até das situações que se apresentavam .

Fui então , num certo momento de minha vida , consultar com um Fonoaudiólogo . Entrevista feita , parâmetros avaliados , iniciei a terapia .Por diversos dias li livros em voz alta com um lápis preso entre meus dentes , falava com duas bolas de gude dentro de minhas bochechas e por aí afora .

Como os resultados eram pífios , resolvi aprofundar-me mais nos exames e descobri que minhas cordas vocais eram , digamos , “soldadas” em alguns pontos e eu só corrigiria isso com cirurgia . Achei melhor não . Continuava a vida .

Fui então , passar umas férias em Peruibe , então um paraíso , onde reunimos um grupo de amigos , colegas , conhecidos para pescar , jogar bola e nadar .

Foi então que três amigos meus , o Durval , o Marcos e o Jair , sabendo do meu problema , resolveram me “ ajudar “ .Souberam de uma benzedeira local que curava gagueira e foram lá . A lazarenta da benzedeira os ensinou á fazer um procedimento que não falharia e eu voltaria á falar escorreitamente . Eles tinham que providenciar uma Peneira para pedra brita 1 , um Balde com água e nessa água colocar 1 kg de sal grosso . Tinham tb que me dar um banho , de surpresa com a água salgada atingindo-me pela frente passando antes pela peneira e me dando um susto . Tinham tb que falar uma frase : - Sai tartamudez , abandone este freguês .

OK , aprontaram tudo e á noite , conversávamos na calçada da casa, bebendo uma cervejinha qdo me chamaram para ver iscas artificiais que estavam montando para a pesca no dia seguinte lá atrás da casa do Durval . Lá fui eu , tranqüilo , gago mas feliz da vida , sossegado e bem resolvido qdo , ao chegar no canto da casa , aparece uma peneira á minha frente e por ela , atravessam um balde de água e sal encharcando-me por inteiro .......putz.......puta susto . Quase infartei .

O puto do Marcão , que teria que falar as palavras mágicas , engasgou e não falou pôrra nenhuma , pois teve um ataque de riso .. Todos caíram na gargalhada e eu , traumatizado com o acontecimento , quis iniciar minha cartilha de impropérios e palavrões mas não consegui pois ;............FIQUEI MUDO com o susto !!!!!! Levei dois dias prá voltar á balbuciar alguma coisa . Me deram chás , fizeram compressas com água de peixe , rezaram por mim , me benzeram com réstia de cebola e uscambau .

Os três quiseram voltar na benzedeira e dar um cacete nela pois o benzimento não funcionou mas interferi afinal , as palavras mágicas não foram ditas e acho que a falha foi aí .

Daí prá frente nunca mais aceitei ajuda de ninguém prá curar minha gagueira , pois outra dessa eu fico MUDO de vez ................tá ruim mas ta´ bão .

Fred Assoni

Comentários:

Nessa época retratada muitos caieirenses tinham casa em Peruíbe, entre eles o Vagner Botoni (saudoso amigo) e era comum as famílias de amigos se revesarem passando férias. Numa delas estava eu e família na residência, o próximo a chegar seria justamente o amigo gago e a prole. No dia da volta para Caieiras depois de deixar tudo em ordem, tive uma idéia brilhante e executei. Esvaziei um corote de madeira com pinga de primeira e coloquei àgua com um pouco de pimenta. Não deu outra, o afoito amigo gago chegando no dia seguinte foi logo tomando um generoso trago da famosa aguardente, segundo comentários do pessoal do Durval que estavam por perto, cuspia fogo e me chingava até a quinta geração. Daí em diante não houve mais jeito, vai morrer gago.

Do amigo filho do Zé ( edson navarro)