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09/03/2021
O baile

Meu amigo Nezinho Indio Véio , soube dum baile semanal , domingueira , que se realizava num bairro vizinho ao que morávamos e teve uma idéia.

Vamos lá , apertar umas coroas , disse ele .

Não gostei muito da idéia mas , dada a empolgação dele e querendo ter novas emoções , concordei entrar nessa gelada .

No domingo á tarde , coloquei uma roupa um pouco melhor , Nezinho colocou um blazer anos 60 , meio apertado e não fechava na barriga , ajeitamos os cabelos ( ou o que sobravam deles ) , um perfuminho Jequiti no cangote e fomos lá .

Peguei meu Lada , ultimo tipo , 1955 , coloquei R$ 10, 00 de combustível e partimos rumo á aventura ..

O Baile dominical era apelidado de “ Bolin / Bolacha “ pois era num salão comum , arrumadinho até , piso de cimento liso , mesinhas de lata ( Skol , Guitt´s e Brahma ) , quatro cadeiras de lata por mesa , um vasinho de flor de plástico e um pratinho com quatro Bolinhos de Chuva e quatro Bolachas Água e Sal Ipanema .

O som era feito por cinco músicos veteranos , experientes , que faziam aquilo prá faturar algum no fim de semana . Pagamos a entrada de R$ 3,00 e entramos . Nezinho quis pegar uma mesa mas achei cedo pois custava R$ 4,00 e iríamos ficar muito expostos . O Salão chamava-se Bailão de Josefina .

O publico era em sua maioria do local mesmo , coroas arrumadas , tribufús , coroas já decadentes , viúvas , descasadas , largadinhas , tico ticos no fubá e afins . Fomos ao bar e sentamos nos banquinhos altos do balcão .

Nezinho quis tomar um goró e não deixei pois vai que arruma uma coroa para dançar e cheirando á cachaça , pega mal . Ele acatou .Pedimos um Piper Mint para cada um

Os pares se exibiam no salão . Haviam casais , usuais freqüentadores do local , que rodopiavam com desenvoltura pelo salão , olhares furtivos , convidativos , frisson , pecado e de repente .....Nezinho sai prá dançar .

Recebeu o sim de uma coroa e saiu á rodopiar alegre e feliz . O lazarento dançava bem e encantou as freqüentadoras locais que começaram á cortejá-lo .

Virou a febre do baile . Todas queriam dançar com o Nézinho .

Foi quando Rubão , o Capo local , pediu sorrateiro que o Conjunto Musical tocasse a Vanera Gaucha do Borghetinho . Esta musica só o Capo Rubão dançava pois exige-se coreografia , coordenação e sincronismo entre os pares .

Começou a musica e Rubão e Geodázia , uma coroa morena bem feita de corpo grudou-se no Rubão e começaram a rodopiar-se pelo salão . Estavam sós pois a vanera era de difícil execução e Rubão e Geodázia a dominavam como poucos.

Pedi mais um Piper Mint com gelo e vi , apavorado , Nezinho adentrar a pista de dança com uma outra coroa .

Putz , fudeu , pensei pois a vanera era quase exclusividade do Capo Rubão . Surpreendentemente Nezinho deu uma aula pros participantes ; Sua parceira parecia grudada nele e rodopiavam com delicadeza , beleza e sincronia pelo salão . Vi a viola em cacos pois Rubão não admitia quem o enfrentasse numa vanera gaucha .

Mais surpreso ainda fiquei qdo olhei para o salão e ele estava lotado de casais dançando furiosamente a Vanera do Borghetinho . Entendi estão que o pessoal não dançava a vanera por temer o Capo Rubão que pensava ser ele o único á dançar aquela musica .

Rubão , quase que desmoralizado olhou com fúria para Nezinho e comecei á arquitetar um plano de fuga pois iria haver confusão na saída .

Lá pelas tantas , perto do baile acabar , puxei Nezinho dum lado e falei –lhe : Prepare-se para fugir pois o negocio está feio pro seu lado .

Muito á contragosto ele aceitou a fuga e me disse : Porra Brancão , eu ia lambuzar umas três nádegas hoje e vc furou meu zóio .

Respondi –lhe : Se vc não correr quem vai ter as nadegas lambuzadas é vc , safado . Ao de leve , na surdina , saimos pelos fundos do salão , pegamos o Lada e fugimos pro Acampamento da Obra .

Ao longe ouvimos até tiro e acho que foi o Capo Rubão de atirou .

Nunca mais voltamos no Bailão da Josefina .

A obra acabou e Rubão aguarda Nezinho até hoje pro acerto de contas .

Fred Assoni

N.R. Fred aproveita para lembrar o grande dançarino  melhoramentino Marco Muniz que dizia "dançar é a forma vertical de um desejo horizontal".