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O cinema pegou fogo

Sempre me lembro daquele dia em que meu irmão Walter Olympio me levou ao cinema que existiu lá no Bairro da Fábrica de Caieiras. Numa das cenas do filme apareceu um enorme avião com o muito barulho de seus motores e eu não me contive com aquela surpresa e novidade e gritei: Wartê, oia o vinhão, oia o vinhão! Várias pessoas que estavam ao nosso redor “caíram” na risada. Talvez tivesse sido a primeira vez que fui ao cinema com meu irmão que já era moço e eu ainda era um garoto sendo oito anos mais jovem que ele. Aquele salão de cinema também servia de palco para eventos da Indústria Melhoramentos de Papel, para a escola local e mais para os grandiosos bailes, inclusive os de carnavais que eram promovidos pelo Clube Recreativo Melhoramentos.

Aos meus dez anos de idade a minha “formatura” do primário foi naquele salão do cinema. Lembro-me de quando eu e alguns meninos da minha classe escolar fomos ao palco para participarmos de um coral para emitirmos uns sons em uníssono que havíamos ensaiado na escola e foram assim: Pum, pum, pum, pum, pumpumpumpumpum, pum, pum até o fim. Quando na escola perguntaram se eu gostaria de fazer parte do coral eu disse que sim. Mas fiquei pensando “coral, o que será isso”? (risos).

Lembro-me de outro fato que ficou na minha curiosidade. Num baile diurno naquele salão do cinema, talvez baile de carnaval, eu estava próximo e abaixo do palco donde os músicos estavam tocando suas músicas. Próxima estava uma moça chorando. Ela estava com o pai e ambos me eram estranhos, não eram do lugar. Não me lembro como fiquei sabendo porque ela estava chorando. Chorava por causa do muito conhecido Luiz Pinóquio (Luiz Silveira). E ele repetidas vezes passava dançando com alguém por onde eu e aquela moça estávamos. Sempre tive vontade de perguntar ao Pinóquio quem era aquela moça e qual o motivo do choro dela. Muitos anos se passaram, o Luiz Pinóquio morreu e eu nunca lhe perguntei.

Quanto ao cinema a entrada dele era bonita. À direita antes da entrada havia um bar muito bem organizado (decorado) que até se parecia com algum bar inglês daqueles dos filmes de cinema. Antes do início dos filmes e durante o intervalo entre eles, os frequentadores tomavam seus refrescos e compravam suas balas, doces e chocolates naquele bar. Na porta da entrada do cinema havia uma cortina de tecido grosso de uma só cor. Às vezes e a noite durante a exibição dos filmes aquela porta ficava aberta e só com as cortinas tapando a visão do interior do salão, bem como a visão da tela donde as imagens dos filmes eram projetadas.

Quem sempre ficava nas imediações daquelas cortinas era o também muito conhecido Senhor Antonio Siqueira. Era ele quem recebia os ingressos de entrada pagos pelos frequentadores. Era ele também que educadamente expulsava os meninos, (inclusive eu) que pelo espaço que abriam entre as cortinas ficavam assistindo ao filme sem pagar (risos). Sempre antes do início do filme se ouvia algumas músicas. A última era “Que será” com a cantora Dalva de Oliveira. Depois dessa música se ouvia o som de uma campainha e ao apagar das luzes começava a exibição do filme.  

Lembro-me daquele dia em que uma notícia triste propagou-se por aquele Bairro da Fábrica “o cinema pegou fogo”. Não me lembro se alguém disse que fora um incêndio (risos). O fato ocorreu antes de 1960, não me lembro em que ano. Com a curiosidade de garoto fui até o local para ver como ficou o prédio do cinema depois que o incêndio o havia destruído. A entrada dele como citada antes ficou intacta. Pelo espaço donde existia a porta de entrada olhei para onde existia o salão, pois, o mesmo que era de assoalho ruíra devido ao fogo que o consumiu e parte dele foi acabar de se queimar no porão donde ficavam depositados os apetrechos ou adereços para as épocas de carnaval. Para aqueles que ainda se lembram, os carnavalescos do lugar saiam em desfile acompanhados por músicos levando a alegria pelas ruas do bairro sob o comando do Rei Momo que era o italiano Piacente Civitarese.

Naqueles dias depois do incêndio falava-se que os responsáveis pela Indústria Melhoramentos iriam reconstruir o prédio do cinema. Demorou mas aconteceu. No mesmo local fora construído outro prédio para na parte inferior ser instalado um restaurante e na parte superior um agradável salão para entretenimentos. Entretanto, no novo prédio nenhum cinema existiu. Cinema passou a existir no caramanchão simples para bailes do Clube Recreativos Melhoramentos, donde também, para lá foram transferidos os bailes que antes eram promovidos no salão do cinema que se queimou. A máquina de projeção de filmes ficava no corredor interno entre os bancos dos associados do clube e de outros que iam lá para assistir aos filmes nos dias em que eles eram exibidos. Lembro-me que era o conhecido Senhor Cesar Constantine quem acionava aquela máquina de projeção.

Altino Olimpio

Abaixo está o link da música “Que será” cantada pela saudosa Dalva de Oliveira sempre antes do filme começar naquele cinema saudoso.

https://www.youtube.com/watch?v=8qtOK57_DCY