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13/11/1985
Ed. 242 - URCASA: de vilã para heroína

O que mudou em 3 anos?

No momento em que toda a imprensa e parcela considerável da sociedade brasileira apontam as estatais como grandes responsáveis pelas dificuldades financeiras que o país atravessa, o JORNAL “A SEMANA” considerou oportuno verificar a atuação da URCASA Urbanizadora Caieiras S.A. uma empresa de economia mista, da qual participa majoritariamente a Prefeitura Municipal de Caieiras a maior estatal de toda a nossa região.

A controvertida empresa foi criada em 1979, pelo então Prefeito Gino Dártora, que sonhava com um instrumento que, ao mesmo tempo pudesse empreitar os serviços de engenharia públicos, sem licitação, a um custo menor, serviria também como mais um canal de sustentação, a sua política pessoal, que podendo empregar grande contingente de mão de obra e manipulando um polpudo orçamento, fugiria ao controle rigoroso do Tribunal de contas.

Ao final da sagitariana administração Gino Dártora, durante a campanha eleitoral de 1982, a URCASA transformou-se no alvo favorito das oposições, inclusive da legenda encabeçada pelo prefeito eleito, Nelson Fiore. Um de seus candidatos a vereador, Prof. Pedro Sergio Graf Nunes, disparava incansáveis catilinarias contra a empresa, a qual apelidou de elefante branco, e que prometia reduzir a pó: “Delenda URCASA”.

Janeiro de 1983, Nelson Fiore vitorioso, foi nomeado (?) para a presidência da URCASA um dos grandes articuladores de sua candidatura, e eminência parda da nova administração, Padre José Cezar de Oliveira, nome sempre citado entre os eventuais candidatos à sucessão de Fiore. Do Prof. Pedro Graf misteriosamente, não mais se ouviu uma só palavra contra a empresa. O que teria feito calar?

Calou-se o professor, um colega seu, o presidente da Câmara Municipal, Milton Valbuza, pôs-se a denunciar. E dentre as denúncias, poderíamos destacar a nota fiscal nº000005 de 28/06/1985 através da qual a URCASA cobra da Prefeitura de Caieiras, o valor de Cr$18.320.982 milhões a título de taxa de administração e menciona a ordem de serviço nº17/85, que diz ser a taxa de 30% sobre o valor da obra. Ocorre que a Lei 1219 municipal só autoriza a URCASA a cobrar do Município até o máximo de 20%. O restante 10% seria, pois ilegal e a Prefeitura teria pago ainda, segundo o vereador, a URCASA usa funcionários da Prefeitura, material de construção da Prefeitura, e ainda de quebra fatura de administração, resultado: o munícipe que no final é quem paga, paga mais 30% sobre o preço real.

Outro fato estranho refere-se à nota fiscal nº000010 de 06/08/85 onde a URCASA cobrou a bagatela de Cr$53.040.774 milhões para instalar uma ponte metálica doada pelo Governo Estadual. Segundo diversos engenheiros da região, esse valor ultrapassa o valor da própria ponte, e seu assentamento foi feito por funcionários municipais por empreiteira dificilmente alcançaria esse valor astronômico.

 

Serviços caros e ruins

O recapeamento asfáltico de parte da Av. Presidente Kennedy e Rua Santo Antonio continua gerando controvérsia, já que os moradores recusam-se a pagar a benfeitoria. O estranho nessa história foram as notas fiscais nos.000001 e 000006 respectivamente de 12/06/85 e 18/07/85, onde a URCASA cobrou da Prefeitura de Caieiras, o valor de Cr$95.320.896 milhões sem mencionar, contudo, a quantidade de metros quadrados ou lineares do serviço que executou, apenas o valor total da obra é mencionado. Pergunta-se como é que a Prefeitura pode pagar uma obra sem saber quanto custou o metro? Também os carnês que os moradores receberam para pagar o asfalto, esse dado não consta, e o munícipe se quiser, que use uma régua para medir a frente de sua casa.

No exercício de 1985, a URCASA está recebendo da Prefeitura, a título de subvenção, a importância de Cr$680.417.799 milhões que, segundo o relatório da diretoria da URCASA, seriam utilizados para pavimentar bairros: Nova Caieiras, Araucária (Parque Industrial) e estradas da Cia. Melhoramentos, e mais o recapeamento de 40.000 metros, com previsão ainda de criar-se frentes de trabalho no valor de 3 bilhões de cruzeiros, tudo isso para o primeiro semestre de 1985. No final desse exercício, tais serviços sequer foram iniciados.

 

Meã Culpa

O próprio relatório da diretoria da URCASA sentencia que a Cia. não desempenhou seu verdadeiro papel, que seria o de realizar obras públicas no Município de Caieiras.
O mesmo relatório diz que a URCASA já está produzindo asfalto, tijolos, blocos, etc. Onde esse material estaria sendo empregado? O asfalto sabe-se que uma parte vai para a Prefeitura de Francisco Morato. Qual o lucro líquido obtido pela empresa nessa operação?

A verdade é que todo esse mistério envolvendo a administração da Urbanizadora Caieiras tem desgastado a imagem do Prefeito Nelson Fiore, sem que este obtenha qualquer dividendo político de eventuais obras da empresa.

Com a manutenção da estatal, o prefeito, talvez a contragosto, nada mais faz que acomodar o artífice de sua campanha, o Padre José, que a partir desse reduto prepara o trampolim para lançar sua candidatura e, pela primeira vez, medir forças, “tetê a tetê”, com seu arquiinimigo, e como ele duas vezes ex-prefeito, Gino Dártora.

A vitória janista na capital, entretanto, deve servir de espelho ao cura, que, diante dos desmandos administrativos, poderá amargar contundente derrota em 1988, apesar do apoio da máquina. E então, só lhe restará queixar-se ao Bispo.


Jornal A Semana