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08/08/2008
Pirapora Não Era Como É Agora


Então a cidadezinha porreta está em polvorosa hein? Ah ah ah ah ah ah.
Para que mais se aprenda, tudo se modifica e vira lenda. Antigamente quando a vida parecia ser mais dura havia mais disposição para aventura. Em Caieiras para alguns serem romeiros de Pirapora era costumeiro. Mais à noite, o percurso se estendia por estrada de terra entre o mato naquele tempo que não existia asfalto. Às vezes a caminhada era a pé, outras vezes de bicicleta ou a cavalo e sem se preocupar com revezes, aqueles atletas tramitando à noite sem intervalo, sem receio aquele passeio parecia um recreio de mancebo para chegar em Pirapora de manhã cedo, onde, a cidadezinha mais era um lugarejo que muito promovia festejo. Em temporadas de festas quando lá o povo se aglomerava, isso facilitava encontrar uma namorada naquele aperto enquanto a banda tocava no coreto. Para alguns a premissa era primeiro participar da missa. Depois, o misturar-se com estranhos era um divertimento sem constrangimento. Doces caseiros eram degustados pelos romeiros que lá passavam o dia inteiro e antes de irem embora, nas lojas compravam lembranças de Pirapora. Um marco para a recordação era o passeio de barco. O Rio Tietê com suas águas limpas era uma beleza pra se vê. Lugar de ruas estreitas, seus moradores em suas casas ficavam as espreitas, em suas áreas ou janelas, admirando quem passava por elas. Naquele tempo o dia caminhava mais lento com o sol no firmamento parecendo emocionado com o devotamento de outrora ao Jesus de Pirapora, o mais digno desse tratamento, ou, para o sol já era um lamento, um prenúncio da mudança de sentimento, da vinda do embrutecimento que tornaria Pirapora vazia e relegada ao esquecimento.

Como surgiu aquele lugar religioso? Existem panfletos onde inscritos estão os fatos que perduram e não foram desfeitos. Se me lembro, a imagem do santo foi encontrada numa corredeira e estava sendo transportada para a Cidade de Parnaíba numa carroça puxada por três parelhas de bois. Tendo atolado no barro de um trecho da estrada, não ouve como desatolar a carroça. Foi quando apareceu um homem, surdo e mudo, que, “falou” para aqueles condutores da imagem: tirem duas parelhas de bois e deixem uma só que a carroça sai do atoleiro. “Diante daquele milagre do homem ter falado”, eles acataram a sugestão e, só com uma parelha a carroça desatolou-se, mas, ao invés de se dirigir à Parnaíba, ela se voltou ou foi para o lugar onde, por isso, passou a se chamar Bom Jesus de Pirapora e situa-se entre a cidades de Parnaíba e a de Salto, aquela de antes da cidade de Itu. Tomando café li essa história e agora sou um homem de fé. Não se deve duvidar das narrativas de padre, eles sempre foram infalíveis. Voltando ao passado, um tal de Giordano Bruno insistia que era a terra que girava em torno do sol e não o sol que girava em torno da terra. O homem era louco e por causa desse absurdo os padres normais o mandaram pra fogueira. Galileu, outro louco que na fogueira não morreu por pouco, também tinha o mesmo pensamento absurdo. Felizmente pra ele, teve a chance de estudar a “verdadeira” astronomia com os padres, reconsiderar seu erro e arrepender-se dele. Bem feito! Mas, Pirapora não era como é agora. Existia a sala dos milagres, se ainda existe deve ter trocado de endereço. A sala servia como comprovação deles. Era onde os que receberam suas graças depositavam e se desfaziam dos utensílios que usaram como auxiliares para seus males enquanto deles precisaram. Bengalas, muletas, mulher folgada, óculos, talvez cadeira de rodas e etc. Numa ocasião estive lá e curioso quis saber o porque de uma fila dentro do recinto sagrado. Havia uma estátua presa numa parede e as pessoas, uma a uma se benziam e depois colocavam dinheiro numa caixa que mais era um cofre com segredo que estava aos pés da imagem. Lembrei-me de um dizer maçônico: quem tem põem, quem não tem tira. Mas, a fila era só para os “quem tem, põem”. Não vi nenhum dos “quem não tem, tira”. Aquele lugar mesmo com a proteção do seu padroeiro foi transformado num bueiro. Isso ouvir ninguém gosta, que, pelo rio a cidade de São Paulo para lá manda muita bosta. Qualquer um perde a estima quando se vê envolto por tanta fedentina que para a cidadezinha se tornou um estigma. Às vezes por cima do rio se avoluma fétidas brancas espumas, não sendo atração nenhuma, lá cada um como pode se arruma. Quando lá o Rio Tietê era navegável o “poder” do local era inegável, mas, não era insuperável como hoje isso é provável. Qualquer evento fica prejudicado num lugar fedorento. Doa a quem doer, muita das “verdades” que se comenta, pouca se sustenta. Ora, ora, pertencem à subjetividade e foram proporcionadas pela criatividade para fins de domínio conseqüente, pois, o que é incoerente só pode existir na mente e dependente do que acredita, qualquer um pode ser demente. Ater-se à realidade traz a verdadeira liberdade. Infelizmente isso ninguém quer, pois, repletas de incentivos, atrativos e enfeites, ilusões pertencem ao sistema de vida vigente. Quem dele está de fora tem mesmo que se isolar ou ir embora, mas, ir pra onde? Só lhe resta rir e cantar: “Sou caipira pira pora nossa Senhora de Aparecida que ilumina a mina escura e fundi o trem da minha vida. Sou caipira pira pora nossa Senhora de Aparecida que ilumina a mina escura e...”



Altino Olympio