Versão para impressão

08/05/2012
Telefonando para o céu

Hoje é dia dos pais. Acordei mais cedo e fiquei morrendo de vontade de ligar para o meu velhinho que já partiu há algum tempo. Passei uns minutos olhando para o celular e só quando a primeira lágrima rolou, tomei coragem...

            A ligação foi rápida, não mais que cinco minutos, como era nosso costume, aos domingos, enquanto vivo. O tempo foi suficiente para revermos uma vida - pelo menos as coisas que mais nos marcaram nestes cinqüenta e quatro anos de convivência.

Falamos de sua alegria no dia de seu casamento. Contou-me que estava muito feliz e

que dançou muito à luz de um lampião e ao som de uma sanfona, a noite inteira. Disse-me que minha mãe dançava muito bem e dançando eles circulavam a barraca coberta de lona, pelo menos duas vezes a cada seleção musical. Falou-me de sua alegria quando da gravidez de minha mãe e por ser eu o primogênito, a sua ansiedade de pai novo era muito grande.       Também me falou de sua tristeza quando o médico sugeriu que minha mãe fizesse aborto devido às hemorragias constantes, cuja gestação corria risco de morte. E ele, contrariando o médico, apostou que tudo iria correr bem, e assim foi feito. Foi N.S Aparecida que salvou você e sua mãe - disse-me contemplativo! Daí o Aparecido de seu nome filho!

Sentiu grande alegria por ocasião de meu nascimento. Disse-me que foi uma das poucas vezes que chorou, mas foi escondido, porque tinha vergonha de fazê-lo diante dos outros. Sua emoção foi muito forte! Contou-me que não via a hora que eu fizesse um aninho para rolar comigo na areia. Adorava me fazer rir fazendo cócegas e caretas só para ver minha boca banguela.  Foi ele quem notou o nascimento do meu primeiro dente.

            Confidenciou-me que me colocou cedo para trabalhar por amor e não por outra razão, pois assim ele entendia que me tornaria um homem de verdade, dando valor para as coisas e sabendo valorizar cada conquista conseguida.

Um pouco emocionado, me pediu desculpas por não ter comprado os poucos brinquedos que eu pedia, quando ia à cidade – principalmente uma bicicletinha - meu maior desejo de infância! Não se esqueceu de dizer do caminhãozinho de madeira que fez com as próprias mãos e me deu como presente de natal, por não ter dinheiro para comprar brinquedos em loja, como ele gostaria. Lembramos dos estilingues e das arapucas que juntos construímos. De seu cavalo tordilho, também não se esqueceu, pois em sua garupa ensaiei meus primeiros passos como “peão”, aos dois anos de idade. Disse-me, que eu era seu carrapatinho!

            Falou do sacrifício que fez, e faria tudo novamente para estudar seus filhos. Falou de quanta alegria sentiu ao vê-los formados e tendo sucesso longe da roça.

            Falamos de minha mãe -, sua companheira por mais de cinqüenta anos. Enalteceu seus valores morais e seu companheirismo até seus últimos dias, no hospital. Emocionou-se ao falar do amor que ela sentia pelos filhos e que se sacrificaria por eles, se preciso fosse.

            Abrimos um capítulo à parte e falamos da passagem muito rápida do tempo. Eu disse que estava sentindo muita sua falta e que gostaria de te-lo tido por mais tempo ao meu lado. Contei o quanto sentia a falta de seu sorriso contido, mas cheio de ternura e alegria me esperando no portão de casa, depois de algum tempo sem visitá-lo. Foi quando ele sabiamente me disse: - Sabe meu filho, a passagem do tempo deve ser uma conquista e não uma perda, pois saiba que a vida não é tão curta assim.  São as pessoas que ficam mortas tempo demais, enquanto vivem. Quem faz o tempo parecer maior ou menor, somos nós.

Sabe meu pai, morro de vontade de chamar-lhe de papai, assim como eu lhe chamava enquanto criança. Não posso negar que sinto falta de seu colo nas noites de temporal, assim como do seu aconchegante colchão de palha macio, barulhento e quente, nas noites que sentia medo de lobisomem e assombração. Pai, o mundo está mudando muito depressa e, temo não dar conta de acompanhar. Na verdade, vamos nos arrastando pelo túnel do tempo, afinal ele é mais rápido e corre na nossa frente. Mas uma coisa é certa: Você será para sempre o meu herói e meu exemplo de vida. Até breve!

            E VIVA O DIA DOS PAIS!  [email protected]


Osvaldo Piccinin