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03/04/2017
Quando a inocência quebra as regras.

Um dia, uma cliente antiga, me avisou que tinha indicado para conhecer meu trabalho, uma pessoa muito exigente, mas muito especial. Como sempre fazia, agradeci muito a indicação e fiquei alerta aguardando a ligação da tal moça.

Não demorou muito, ela me ligou querendo marcar um horário.

Quando finalmente ela chegou britanicamente no horário marcado, fiquei um tanto surpresa, pois como já tinham me dito que ela era uma juíza, fiz mentalmente um perfil de uma pessoa mais velha e um tanto sisuda.

Na verdade, ela era uma mocinha linda, magrinha, impecavelmente vestida (de Juíza), já que vinha para a consulta depois do trabalho. Disse-me que eu tinha sido muito bem indicada e que ela tinha uns horários um tanto difíceis, mas que faria o possível para não falhar.

Embora, tão jovem, impunha respeito e acreditei que com ela, seria um pouco mais difícil a espontaneidade que me é peculiar.

Agradei com meu trabalho logo na primeira sessão e ela, para minha alegria, disse que daria continuidade ao tratamento.

E assim, semanalmente ela começou a frequentar minha sala de estética, aumentando gradativamente os tratamentos.

Como disse, era jovem, na verdade tinha um pouco mais de idade de uma de minhas filhas e até tinham estudado no mesmo colégio.

Fomos convivendo e acabei acompanhando sua vida, embora de longe, logo conseguiu uma transferência para uma área melhor para sua magistratura.

Namorava na época, ficou noiva, e de repente eu a vi casando e conquistando seus espaços cada vez mais, pois faziam um casal bem centrado nos objetivos.

Eu gostava muito de conversar com ela, mas discretíssima, eu tinha a impressão de que ela não despia a toga da magistratura, estando em público. Claro que eu não a conhecia na intimidade e nunca a tinha visto sem estar vestida de juíza.

De acordo com os planos do casal, no momento certo, ela resolveu engravidar, e pela primeira vez, eu me senti um pouco mais útil para ela, pois consegui ajuda-la a conseguir uma excelente arquiteta que fez, com maestria a decoração do quarto da bebê. Ela teve uma linda menina. Como sempre gostei de presentear os bebês de minhas clientes, com trabalhos manuais feitos por mim, ela me convidou quando a filhinha nasceu a ir visita-la

Foi uma surpresa vê-la vestida informalmente e quando contei a minha impressão, ela riu muito e me disse: “- Selma eu sou normal como qualquer pessoa, desculpe se passei essa imagem para você”.

Assim que foi possível, ela voltou para a minha sala de estética, estava cansada e estressada, como sabemos que é normal, para as mamães nos primeiros meses.

Conversávamos mais, afinal, sou mãe de 4 filhos e 6 netos, tinha muito a dividir com ela.

Vi seu lado mãe aflorar muito bem. Sempre costumo dizer que “quando nasce um bebê, nasce uma mãe”, mas infelizmente essa regra nem sempre é verdade.

Acompanhei o crescimento de sua menina, ficamos mais próximas e ela mostrou-me sua sensibilidade, mas nunca deixava de ser regrada em nada.

Sempre a achei tensa demais, e às vezes até me preocupava com ela.

Continuou frequentando minha sala de estética, mas muitas vezes, como dependia de outras pessoas, acabava falhando em nossos horários, e ficava muito constrangida, aborrecida mesmo, por deixar me esperando.

Até que uma vez, como estava acontecendo de novo ela não conseguir ir, pois não tinha com quem deixar a sua menina, eu disse a ela que trouxesse a sua filhinha para a sessão.

Ela espantada, me perguntou: “- Posso mesmo? Tem certeza? Eu fico muito constrangida em faltar de novo, mas não quero atrapalhar você, levando a minha filha”.

Procurei tranquiliza-la, dizendo que para mim era normal, afinal muitas vezes minhas clientes tinham que levar seus filhos à sessão.

Ela chegou muito sem graça, pedindo desculpas, e fazendo mil recomendações para a menininha, que por sinal, era um doce de criança. Trouxe livrinhos, cadernos, lápis, enfim uma gama de distrações, para a mocinha, que para desespero da mãe, estava mais interessada nos inúmeros aparelhos e apetrechos de estética que havia em minha sala.

A minha cliente não relaxava e a menininha perguntava e perguntava, e eu estava achando a situação engraçadíssima, pois a curiosidade de uma criança sempre me fez bem.

Foi então que a mãe disse: “- Filha por favor, deixa a tia Selma trabalhar, senão vamos demorar para ir embora.”

No que a garotinha saiu com a frase que quase fez a mãe cair da maca pelo susto.

- “Nossa, tia Selma, nessa sua casa, não tem nada para comer?”

Imaginem a gargalhada que eu dei.

Imaginem a cara da minha cliente juíza, perfeccionista.

Por fim ela conseguiu rir, enquanto eu fui buscar umas guloseimas para a garotinha esperta e quebradora de regras.

Desde esse dia, ficamos muito mais próximas, ela trouxe muitas vezes a sua filhinha para a sessão e eu sempre tinha umas coisinhas boas para ela comer.

No final das contas, ela já ia para a parte intima de minha casa, e brincava com meus bichinhos, meu filho e meu marido.

Acabaram-se as regras comigo! A juíza ficou no fórum. Quem entrava na minha sala de estética, era a minha amiga querida.

Acompanho até hoje o crescimento de sua filha quebradora de regras pelas redes sociais, quando ela posta alguma foto. Ela está uma linda menina. E minha cliente continua uma linda mulher.

Selma Esteticista