Versão para impressão

13/12/2021
Sair da bolha

Eu não tinha pretensão alguma de sair de perto de minha família. Muito menos para outro país. E sozinha, nunca mais. Assim eu estava.

Na minha bolha, estudando uma forma de transformá-la numa oca permanente.

Argumentei ferozmente minha opção por permanecer aí.

Não consegui!

Na preparação para minha viagem a Costa Rica, conheci as exigências para entrar e permanecer por no máximo 90 dias ( máximo permitido para estrangeiros) no país.

Dentre os requisitos: provar através de documentos a vacinação completa. As vacinas aceitas: AstraZeneca, Janssen, Moderna, Pfizer, Sinovac, Sinopharm, Covaxin ou apresentar apólice de seguro médico específica nos termos exigidos.

O seguro saúde deveria cobrir todos gastos de hospedagem em caso de quarentena, e médicos gerados pela enfermidade COVID-19.

No prazo exato de 72 horas antes de ingressar ao país, é obrigatório o preenchimento do “passe de saude”, que depois de analisado gera um “QR code”, enviado ao correio eletrônico do pretendente. 

Viagem : Houston - Mexico,

Mexico - Costa Rica.

Chegada: Aeroporto Internacional Juan Santamaria, São José.

A sensação de entrar num país “de olho em você”, é de segurança, senso de coletividade, responsabilidade compartilhada.

Nos guichês da imigracão não existiu gentileza, ainda que por todos lados as fotos, decorações deem a sensação de que CR é a recepção do paraíso.

Antes de encostar no balcão, o oficial já pedia o “QR code” que foi rapidamente escaneado com o passaporte.

A sensação é de premissa culposa. Até a prova da regularidade com os protocolos sanitários, todos são culpados e infectados.

Na extensão dos corredores do Aeroporto havia dispensers de álcool em gel. Detalhe: limpissimos, sem lambança caindo pelos lados ou digitais marcando as pencas de dedos de passagem.

Uma longa caminhada imaginando as aventuras que gostaria de um dia fazer naqueles lugares exóticos, e no próximo ato: medir a temperatura corporal através de um tipo de RX. 

Não fosse a advertência, em bom tom para que o rapaz que andava atrás de mim, tirasse o boné, não teria percebido o aparato, tamanha  discrição dos agentes que operavam o termómetro gigante.

Ninguém estava sem máscara de proteção, ou meia boca! 

A impressão de vigilância contínua assopra os cantos de CR.

Estive hospedada num hotel de rede internacional acessível economicamente a porcentagem significativa de turistas.

E sem vestígio de vida pelos cantinhos no quarto desinfetado!

Na entrada do hotel havia uma mesinha com fichário de anotações e dois senhores faziam a inspeção dos visitantes.

Um termômetro acoplado a um dispositivo de álcool em gel. 

O tempo par entre uma esguichada e o apito com a temperatura.

Na recepção, mais álcool, sempre em equipamentos com sensores.

Daí para frente, tive uma lição de higiene para qualquer um tirar o chapéu!

A consciência da necessidade de conter o avanço do vírus é expressiva.

Os estabelecimentos possuem do lado externo,  pias com sabonete líquido, maiss álcool em gel, e uma rigorosa inspeção de temperatura corporal.

Algumas pias são improvisadas, com controle mecânico da saída de água.

Não há passe verde sem mão lavada. 

Em lugares basicamente rurais e mesmo a céu aberto: máscara e esfregar  as mãos. 

Todos os restaurantes nos quais estive, dos mais simples, com comida típica caseira, aos mais refinados não havia ressalva. Não se pode entrar em grupos grandes, sem máscara, sem lavar as mãos, esfregar os pés nos capachos. Sempre alguém de olho nas portas, verificando os clientes.

Numa minúscula igreja da pequena cidadezinha,  um senhor simplório fazia o serviço de guardião.

Visitei os prédios do histórico “Sanatório Carlos Duran Cartin” para tuberculosos.

Embora seja um ponto turístico, não há verbas para financiar a recuperação do patrimônio.

Então, a placa com nome do local,  em letras maiúsculas e manuscritas contrastam com os largos cartazes do Ministério da Saúde  esclarecendo maneiras corretas de tossir e espirrar e uso correto da máscara,  bem como a presteza dos lavatórios. 

Duas guaritas e um segurança recebiam dezenas de turistas organizados impecavelmente.

O responsável pela recepção dava sermões até ameaçadores de repressão:

“Está terminantemente proibido a entrada sem máscara bem como tirá-la rapidamente para fotos. Precisamos impedir o avanço da pandemia. Temos agentes vigiando as instalações e caso sejam vistos contrariando as normas sanitárias,  serão retirados e repreendidos verbalmente publicamente”.

Entrei com medo de pisar no lugar errado. 

Um país que vive basicamente do turismo, busca maneiras de  esquentar a economia com rigor e sustentabilidade.

É nítido que a população de modo geral, já incorporou o ritual de combate  à pandemia. 

Foi assim que passei uma semana boquiaberta pela arrumação sincronizada e compreensão da importância da limpeza.

Mas como não há sistemas perfeitos, o índice de contágio, na época de outubro de 2021, estava alto.

As medidas adotadas também: após as 22:00 horas, toque de recolher até o dia seguinte, a partir do horário indicado. 

Com especiais autorizações, alguns setores podiam atuar durante este período de recolhimento.

Também implementaram rodízio de automóveis.

Mesmo com os esforços do Governo, agentes de saúde, e da maioria da população, a vacinação incompleta e a resistência, deixavam evidente a imprescindibilidade de estreitamento das ações de saneamento e vacinação.

Partida : Aeroporto Internacional Juan Santamaria, Sao Jose.

Se a entrada no país é um primor, a saída está engatinhando na confusão  entre inspetores espalhados pelas filas dos guichês das companhias aéreas e passageiros confundidos.

A ideia da vistoria dos agentes é mais uma vez um afago.

Manter distanciamento estava complicadíssimo. Não entendo quanta sapiência carece o indivíduo para compreender o significado de manter distância.

A exigência do exame de covid para entrada em outros países era evidente o motivo de  desesperação aos passageiros desavisados.

Gente perdendo voo, arrastando malas no meio da muvuca, gritando para o parente do outro lado da fila, protestando.

Entrei exausta no avião.

De volta ao “mundo de plástico!"

Sair da bolha foi o passo mais amedrontado que dei.

Tudo isto (pandemia) nos separou.

Tudo isto também nos juntou num uníssono clamor pela sobrevivência.

Sair da bolha faz dar se conta que a polarização dos mundos não tem nenhuma validade diante o inferno das mortes que vimos e vemos, da urgência de novas sinapses sociais, econômicas, humanitárias.

A boa notícia é que estamos caminhando, ainda que timidamente. Alguns com mais equilíbrio, outros descalços e um tanto de outros ainda perturbados carregando suas bolhas.

O mundo está sim se preparando para um tratamento de acolhida de diversas formas.

Ainda numa abordagem insegura, em fase de ajustes, testes mas exaustivamente continua no trabalho de seguir lutando.

Nossas bolhas deram algum tempo para que a ciência conseguisse uma luz no breu que estávamos.

O mundo está se adaptando a esta realidade.

Esperanca!

Obs:.CR foi um dos países que mais resistiu ao início da  pandemia.

Com número menor de mortes e infectados nos primeiros meses, atraiu estrangeiros que deixaram suas origens para trás, estimando qualidade de vida.

 

Daniele de Cassia Rotundo