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15/02/2024
O último dos Moicanos. 

Tudo começa com duas pessoas que um dia resolvem  construir uma família…

Então os filhos vão chegando…

 Um, dois, três e seriam mais se a vida não tivesse dito: “NÃO”

É impressionante como tudo vai acontecendo como num filme, num passe de mágica e quando damos por nós, somos uma família barulhenta, com crianças correndo pela casa, com as brigas de irmãos, enfim pessoas que mesmo aos trancos, barrancos e separações dos pais, crescem, viram adolescentes insuportáveis, entram  numa faculdade e um dia sem aviso prévio , pisco os olhos  e eles começam a alçar voos distantes de nós…

A primeira saiu cedo, foi estudar em outra cidade e consequentemente morar com o pai. Essa foi uma das despedidas que pegou-me realmente de surpresa. Aquela certeza de que a mãe seria a pessoa mais importante da vida dos filhos, cai por terra, causando -me um tremendo abalo nos alicerces. Lição amarga. 

A segunda ficou mais tempo comigo…fez faculdade, formou-se, trabalhou por aqui e por fim, seguiu com o amor de sua vida, pra longe de minha vista…mas não me pegou desprevenida, tive tempo de vê-la se casando, sonhando e ao partir, deixou comigo por escolha dele mesmo, meu neto querido que criei até os 18 anos e que também partiu um dia para bem longe de mim…mergulhei por meses a fio numa saudade e tristeza profundas. Pensei que tivesse aprendido a lição, mas fui reprovada e tive que repetir para lembrar que criamos os filhos e netos … para o mundo. 

E  um dia sem aviso prévio, ele me fez bisavó. 

Em casa tinha ficado meu filho mais novo que por algumas vezes foi morar com colegas da faculdade e um dia já formado, voltou para casa e foi ficando por mais tempo que gostaria, pois agora era eu que precisava dele. Sentia - me segura ao seu lado. Estava protegida por meu marido e por meu filho. Meu castelo era bem guardado pelos dois escudeiros e eu achei que seria assim até o fim de meus dias. Mas, sempre tem um “ mas”… e a vida com suas eternas graças e surpresas, trouxe me a novidade: Meu filho resolveu que já era hora dele alçar seu próprio voo, seguir seu caminho e assim bem devagar em doses homeopáticas, com seu jeito discreto de ser, ele foi saindo …até a maneira de ir levando seus pertences foi suave, não me deixando aquela sensação de vazio que senti na partida dos irmãos. 

De repente olho em volta e ele não está mais. 

Quando acordo de manhã, olho para a porta do seu quarto preocupada com o horário,  então me lembro que ele se foi. Ainda é estranho, sinto falta de sua presença, mas ao mesmo tempo, sinto-me feliz por ele, lutou e venceu mais uma de suas batalhas, conquistou sua casa e sua liberdade. 

Ele ficou até quando pôde. 

Mas também partiu…

Ele foi o ÚLTIMO DOS MOICANOS !

Selma.

COMENTÁRIOS

Mãe
Boa tarde
Mesmo no turbilhão imensurável que minha vida caminha, sempre paro para ler seus textos. Sabia que cedo ou tarde iria ler algo assim... são muitos anos de convivência para saber o que outra pessoa pensa e sente. Logicamente, mesmo sabendo que este momento chegaria, não tive a estabilidade emocional que gostaria, então acabei por derrubar as lágrimas que cada vez mais são raras de serem vistas neste mundo tão insólito e efêmero... 

As vezes penso em quantos caminhos incorretos ou escolhas equivocadas eu poderia ter seguido e definido... e neste sentido, juntamente com tantos outros, realmente me considero o último dos moicanos!!! Alguém que não tem mais seu “povo”... sua casa, ou mesmo uma identidade inabaláveis... mas a vida é assim!!! Aceitei minhas diferenças com o mundo, tolero, muitas vezes a contragosto... mas o que significa engolir um sapo para quem já teve que digerir baleias? NADA...

Poucas coisas neste mundo me fazem continuar... a moralidade, gratidão, aprendizado e não menos importante, meu dever existencial de proteger aqueles poucos afortunados que detém meu respeito, carinho, admiração e amor...

Durante anos fui o maior causador de discórdia entre todas as pessoas próximas... minha energia existencial pulsante, libertadora e moral me fez cometer desagrados desnecessários... mágoas, tristezas e decepções!!! Minha forma singular de amar, cuidar e proteger por vezes sufocou as pessoas... esta minha intensidade nas ações e sentimentos geraram muitos desafetos... mas sempre continuou a lapidar o que tenho de melhor em mim... transformando lentamente o carvão em diamante bruto e este, numa joia que poucos conseguem vestir ou mesmo admirar e respeitar. Então agradeço a todos que não partiram por serem confrontados com minha essência exorbitante e um tanto desequilibrada.

Sempre me preocupei e não ser “ingrato” com estas pessoas próximas... ainda que por vezes tenho que confrontá-las com minha rispidez para protege-las!!! Você fez suas escolhas e seguiu seu caminho de vida conforme as possibilidades e as escolhas que pode fazer. Respeito sua história, admiro e principalmente agradeço o exemplo, ainda que eu tenha a plenitude de saber que não suportaria determinadas passagens. Todos têm seus fantasmas, medos, traumas, receios... e a ingratidão é um deles na minha vida!!! A dualidade de seguir caminhos distantes ou estar próximo protegendo aqueles que me sinto responsáveis pela gratidão, sempre me deixou em situações complexas... mas aos poucos fui conseguindo escrever uma história respeitando este limite!

Você, como borboleta, se transformou na vida... pode voar livremente e gerou muitas coisas através de sua eterna ação de polinizar as flores que sempre cuidou zelosamente. Flores estas que também geraram seus frutos... os quais, como borboleta, só pode aconselhar e admirar...

Tem sua cravo existencial ao seu lado (Helio), que garante sua segurança contra os predadores deste imenso jardim da vida, assim como te aconchega quando está cansada de voar pelo jardim que insiste em manter limpo e funcional... eu nunca fui exatamente uma das flores deste jardim! Sou aquele besouro de casca dura, teimoso, pouco chamativo/ atrativo, trabalhador incansável que acompanha e protege o jardim de diferentes formas, sob diferentes óticas. Claro que por muitas vezes caio, pois meu plano de voo não é gracioso como o seu... só vou... na direção que devo ir... as vezes acabo batendo nos obstáculos e acabo tombando... mas alguém do jardim acaba por auxiliando a desvirar-me... e assim continuo minhas ações de observação e proteção. 

Não saí do jardim, estou tão próximo como tenho que estar, vigilante como sempre fui, protetor como sempre me propus!!! Não se engane em pensar que estou distante por estar em uma árvore mais distante... ainda tenho a capacidade de observar o que desejo para garantir a segurança do jardim!!! As vezes é necessário se distanciar para ampliar a capacidade de visão e assim ser mais efetivo... 

Você, suas flores e frutos sempre estarão sob meu resguardo... ainda que eu não tenha a mesma capacidade de cada um dos integrantes do jardim, não significa que deixarei algo o destruir. Sigo minha missão de gratidão existencial, mesmo com minhas imperfeições... posso garantir que escolhi meticulosamente a posição que me encontro, assim como o momento em que resolvi me locomover... NADA é por acaso quando depende de mim...    

Posso até ser o último dos moicanos deste jardim, mas em absolutamente nada isso altera meus valores... não importa aonde, quando e como estou... SEMPRE continuarei lutando para que o jardim esteja protegido...
Até mais.

Matheus
🐡🐡🐡