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05/11/01
Apnéia, uma doença que só os outros percebem

A falta de ar no sono pode até causar um ataque cardíaco, mas o tratamento é simples

Ronco, cansaço, falta de memória, irritabilidade, sonolência durante o dia ou ir ao banheiro várias vezes durante á noite. Problemas comuns como esses, que raramente parecem graves o suficiente para motivar uma consulta médica, são sintomas de uma síndrome da apnéia, que atinge entre 2% e 4% da população mundial. Muitas outras - cerca de 30% dos brasileiros roncam - podem também sofrer de apnéia obstrutiva do sono, sem saber. A doença causa interrupções momentâneas da respiração durante o sono e leva ate a ataques cardíacos, mas em muitos casos é evitada de forma simples. "È uma doença silenciosa", diz o professor de neurologia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Admir Baptista Silva. Segundo ele menos de 1% das pessoa que sofrem de apnéia no Brasil estão diagnosticadas. Como afeta o estado mental, provocando inclusive depressão, muitos apnéicos acabam recorrendo a tratamentos psiquiátricos que não diminuem os sintomas. Outro problema é a identificação da síndrome. Ela só se manifesta quando a pessoa está dormindo, então quem percebe são os outros. Carlos Alberto Borges, de 39 anos, chegava a acordar 300 vezes por noite para respirar. Sem notar, a maioria das vezes. Facilmente perceptível era o ronco, que incomodava sua mulher, ro o cansaço de todo dia - "Eu ate cochilava no congestionamento", conta o engenheiro. Depois de procurar um otorrino, passar pelo neurologista e fazer um exame chamado polissonografia, no qual o paciente passa á noite no hospital e tem seu sono monitorado, descobriu que era um apnético. "Hoje a minha disposição aumentou 1.000%. É outra vida". Borges agora dorme com um aparelho intra-oral, que reposiciona a mandíbula e deixa o ar passar. A respiração voltou ao normal e o ronco sumiu. O problema do apnéico é que, enquanto dorme há um relaxamento da musculatura responsável por manter a mandíbula para frente e a faringe aberta, garantindo a passagem do ar. A obesidade, com acúmulo de gordura na região do pescoço, também deixa esse canal mais estreito, obstruindo a respiração. O resultado é a falta de oxigênio e um déficit energético, que causam sonolência, irritabilidade, aumento da pressão sanguínea, parada cardíaca e até a morte durante o sono. O aparelho feito de aço inox e resina, precisa ser instalado por um dentista. "Ele não modifica estruturalmente a boca. É como os óculos, que não corrigem a visão, mas resolvem o problema quando estão sendo usados '', diz o cirurgião dentista Marco Antonio Cardoso Machado, que tem mais de 300 pacientes apnéicos. Ele explica que o tratamento é apenas para quem tem a doença em níveis leve e moderado, ou seja, casos em que o exame identifica no máximo 40 interrupções da respiração por hora".De 80% a 90% dos pacientes poderiam usar o aparelho intraoral ". Afirma Baptista. São poucos os pacientes que conseguem se curar da apnéia (a palavra significa, em grego, sem respiração), que foi diagnosticada pela primeira vez na década de 60. Quem se livrou da doença teve de se submeter a cirurgias que deslocam totalmente o maxilar e a mandíbula. O tratamento para a maioria dos casos mais graves costuma ser um aparelho chamado CPAP (que na tradução do inglês, pressão continua de ar nas vias aéreas), que é um equipamento elétrico que força a entrada do ar mantendo as vias aéreas superiores abertas. O inconveniente é que é preciso dormir com uma espécie de máscara de oxigênio. No passado a traqueostomia era o único alívio para os apnéicos, mas o desconforto e o risco alto de infecção acabaram com essa opção.

O Estado de São Paulo