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02/05/2012
Que tal o dólar a R$ 3,50?

CARLOS ALBERTO SARDENBERG

Não há números exatos, mas lojistas brasileiros não têm dúvidas: estão perdendo vendas para o comércio de Miami e Nova York. Os sinais são evidentes e o primeiro deles é a atual dedicação do governo americano em facilitar a concessão de vistos para brasileiros. O outro está nas contas externas brasileiras.

No primeiro trimestre deste ano, gastamos US$ 5,4 bilhões lá fora, um salto de 13% sobre o mesmo período de 2011. É verdade que o volume de gastos vem diminuindo na comparação mensal: US$ 2 bilhões em janeiro, ante US$ 1,6 bilhão em março. Isso coincide com a alta do dólar, de modo que essa pode ser uma explicação. Mas quanto precisa subir o dólar para eliminar a vantagem de comprar lá fora?

Fiz algumas comparações com preços de roupas, calçados e aparelhos eletrônicos. Em todos os casos, o dólar precisaria ir muito além. Por exemplo: encontrei um modelo de tênis muito conhecido no mundo, para praticar tênis, fabricado no Vietnã, sendo oferecido no Brasil por R$ 299, na promoção. Curiosamente, o modelo também está em promoção nos Estados Unidos, onde sai por US$ 85 - ou R$ 161, com o dólar já a R$ 1,90. Ainda assim, a metade do preço brasileiro.

Para que o preço local se equilibrasse com o americano, seria necessário um dólar a R$ 3,50. Ora, nem os mais entusiastas defensores da desvalorização do real acreditam que seja razoável chegar a essa cotação.

O dólar chegou a esse nível, perto dos R$ 4, no período pós-Real, apenas numa ocasião: em setembro de 2002, véspera da primeira vitória eleitoral de Lula, quando se imaginava que ele fosse desmontar a política econômica de FHC, pilar da estabilidade. Naquele momento, as exportações brasileiras estavam na casa dos US$ 60 bilhões/ano e as reservas internacionais nem chegavam a US$ 20 bilhões.

Hoje, com a estabilidade macroeconômica completando 18 anos, as exportações passam dos US$ 250 bilhões e as reservas, dos US$ 350 bilhões.

Ou seja, no preço brasileiro local tem muito mais do que um real valorizado - tem todo o custo Brasil.

Com imposto? Na semana passada, a polícia deu uma batida num shopping popular em Belo Horizonte. Pegou todo mundo sem nota fiscal de venda e de compra. A Rádio CBN entrevistou um dos lojistas, quase todos ex-camelôs, para os quais, aliás, fora instalado o shopping. Ele disse o que se sabe: num mercado popular, se for pagar imposto, não dá.

Para a classe média, dá para pagar bem menos imposto: nos Estados Unidos.

Perderam a noção. Por falar nisso, eis um caso de custo Brasil, custo governo.

O trabalhador brasileiro ganhou, em março, R$ 1.728,40. Trata-se de uma média, é claro, de todos os rendimentos do trabalho formal ou informal, no setor público ou privado. É uma medida do IBGE e revela um ganho real, descontada a inflação, de 5,6% sobre o vencimento de um ano atrás. Na verdade, trata-se do valor mais alto para um mês de março, desde 2002.

Mas o Senado Federal tem coisa melhor, muito melhor. Vagas para policial da casa - segurança -, sem necessidade de curso superior, com salário de R$ 13 mil.

Quem ganha esse salário no setor privado?

Todo domingo, este jornal publica, no classificado Empregos, uma tabela geral de salários. São valores médios, obtidos em pesquisa com empresas de diversos portes e setores, sem vantagens, adicionais, prêmios, etc. - como são os R$ 13 mil dos seguranças do Senado, de modo que a comparação faz sentido. Sem contar que o Senado costuma ser generoso nas vantagens pessoais.

Em todas as áreas do setor privado (Administração, Recursos Humanos, Marketing/Vendas, Contabilidade, Tecnologia da Informação, Indústria de Transformação e Logística), só gerentes empatam ou passam dos R$ 13 mil. E nem todos. Em Marketing, por exemplo, um gerente de produtos ganha na média R$ 11 mil.

Na categoria dos engenheiros, sem cargos de chefia, os salários mais altos chegam a R$ 12 mil. E isso para engenheiro de obras sênior, com diploma, claro, e muitos anos de experiência.

Em toda a tabela, os salários mais altos estão na casa dos R$ 17,5 mil, remuneração de gerentes industriais e de Tecnologia da Informação.

De novo, são valores médios. Logo, é claro que tem gente ganhando mais do que isso em muitas empresas. São, entretanto, os pontos altos, não definem a regra. Há advogados que ganham mais de milhão por mês, por exemplo, defendendo os "melhores" bandidos nacionais. Mas um advogado sênior "normal", digamos assim, numa boa empresa, ganha em média R$ 10 mil por mês.

Quando os servidores públicos, especialmente aqueles das carreiras mais bem remuneradas, reivindicam aumentos salariais, costumam se comparar com estrelas do setor privado. Não faz sentido.

Resumindo, o setor público paga bem. Um consultor legislativo, de novo no Senado, começa ganhando R$ 23 mil, com plena estabilidade. Não arranja isso no setor privado, a menos que seja um fora de série.

Alguns dirão: é o setor privado que paga mal.

Errado: os salários são definidos pela capacidade, formação, pelo desempenho, entrega de resultados e pela oferta e demanda de mão de obra. E sempre considerando custos e margens. A empresa paga o que pode pagar, considerando o que vende e o que fatura. (Aliás, neste momento, salários estão em alta no Brasil justamente porque a taxa de desemprego está em baixa histórica.)

Já no setor público, os salários são definidos pela capacidade política de influência. Quanto mais perto dos gabinetes de Brasília, maior o salário.

Na mesma ocasião em que o Senado oferecia R$ 13 mil para seus seguranças, a prefeitura do Rio de Janeiro abria vagas para professor de matemática e espanhol. Salário: R$ 3,4 mil.

*JORNALISTA

SITE: WWW.SARDENBERG.COM.BR


Mariana Aleixo Boani - Economista

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