18/05/2018
Sorrir sempre

A vida nunca foi das mais fáceis para ela...

Filha mais velha de portugueses severos, dela eram esperadas as atitudes mais adultas, embora fosse ainda uma criança.

As folgas eram poucas, porque além de escola e lições, tinha os trabalhos em casa, como ajudar a cuidar dos irmãos mais novos, como era costume antigamente, que os pais enchiam a casa de filhos e cabia aos mais velhos criar os menores...

Então, era com ansiedade que ela esperava as férias escolares, onde as crianças tinham direito a uma viagem para a casa da praia e ali eles podiam brincar, juntar-se com os primos, fazer enfim, o que durante o ano praticamente lhes era proibido.

Já que a as mães se reuniam nessa época, se ajudavam entre elas e as crianças tinham mais uma vida como seria o normal para os dias de hoje: “vida de criança”.

E provavelmente, com medo de perder esses dias tão esperados durante um ano todo, foi que ela escondeu um acidente que sofreu numa brincadeira com os primos, onde seu braço, foi quebrado...

Imaginem a dor que essa menina passou durante os dias que lá estiveram, mas por não querer que as férias terminassem para ela, ficou calada e não mexia o tal braço.

Os dias se passaram e quando finalmente perceberam que havia algo errado com ela, o estrago já estava muito grande.

Levada para um hospital, onde foi atendida por um médico sem experiência, a engessaram sem perceber que já havia crescido um pedaço de carne entre os ossos quebrados.

Aconteceu que essa atitude fez com que o braço da menina “necrosasse” e ela quase o perdeu.

Foram feitas operações na tentativa de salva-lo, mas isso custou enxertos e muitas cicatrizes no braço e corpo de uma adolescente que carregou isso pelo resto da vida, sofrendo todo tipo de “bulling”, tão comum entre os jovens que, cá entre nós, chegam a ser muito maldosos.

Mas, eu que a conheci há muitos anos, costumo dizer que o nome dela é “sorriso”, porque ela o mantem a todo o momento nos lábios, mesmo que esteja falando um palavrão! Rsrsr!

Ela foi em frente, carregando aquela marca, mas nada a impediu de estudar, ser uma excelente profissional e responder sempre com naturalidade o porquê daquela cicatriz...

Teve seus sonhos de casar-se como toda jovem, mas não foi feliz nesse quesito...

Viu seus irmãos constituírem família e coube a ela ajuda-los até financeiramente, porque afinal, como ainda dizem seus pais nos dias de hoje: “você é sozinha”, pode ajudar...

Ela assim o fazia, por amor e talvez porque achava que fosse realmente sua obrigação...

Até aquele dia...

De repente, uma pequena coceira, uma coisa que aparentemente era bobagem, mas como não passava, ela foi ao seu médico e pediu uma pomada para uma alergia que estava no bico do seio. Ele também achou que não fosse nada demais, mas mesmo assim, pediu para fazer um pequeno exame só por praxe.

Mas era. A tal mal afamada doença.

Ela já fazia tratamento comigo na época, então eu pude acompanhar todo o processo que tão corajosamente ela enfrentou, e posso dizer que foi praticamente sozinha, porque afinal os pais já eram velhos, a irmã tinha filhos etc etc...

Minha querida cliente deu lição de coragem nesses momentos.

Foi confiante fazer a cirurgia.

Foi confiante e sozinha fazer as radioterapias...

Quando voltou para mim, estava toda queimada do tratamento, seus cabelos tinham caído... mas seu sorriso.... Ha esse estava sempre ali. Esteve sempre ali.

Mais uma pequena cicatriz, mas ela?

Ah ela continuava sorrindo, mas com uma grande mudança nos seus projetos de vida: VIVER... SIM... VIVER.

 

Porque até então, ela vivera para a família, para se doar, para abdicar de tudo em função deles.

Como foi bom vê-la mudar de vida.

Hoje, aposentada, aprendeu que a vida é uma benção, é uma dádiva e deve ser vivida para si.

De cabelo curtinho, com seu aplique para disfarçar os que não cresceram mais, ela vai...

Vai sempre em frente, faz ainda os exames para ter a certeza que tudo está sob controle, mas acima de tudo, o que aprendi com ela é que sempre é possível recomeçar, continuar seja sozinha ou acompanhada.

Resolveu que quer viver para si, viajar sempre, conhecer novos lugares aí espalhados pelo mundo... Até o carro ela vendeu, não quer compromissos, gosta de caminhar, quando não é possível, anda de taxi, mas está vivendo...

Nesse momento em que estou aqui escrevendo essa crônica, sabem onde ela esta?

Em Vegas.... São Francisco... California...

Ela está vivendo!

Ela está livre!

Está tão livre, leve e solta que outro dia mesmo me contou:

-“Joguei fora meus soutiens, agora só uso protetor de seios”

Rsrsrsr....Seja livre minha amiga “M.A.O.” admiro você demais!

Selma Esteticista


 



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