08/05/2012
O primeiro emprego - Parte 1

Foram anos de luta e muito sacrifício, tanto meu como de minha família, para conseguir me formar. Depois da formatura os desafios seriam outros - conseguir um bom emprego e ter sucesso. Afinal, minha faculdade de agronomia – Luiz de Queiroz - dava-me total segurança para sonhar com dias melhores. Todo Esalqueano é um apaixonado, e enche o peito de orgulho ao falar de sua faculdade.

            Com vinte e três anos de idade, “cheio de amor pra dar”, como dizíamos na época, diante de muitas entrevistas nos programas de seleções, finalmente fui contratado por uma grande empresa. Estávamos na década de setenta, em plena ditadura militar e no auge da era do milagre econômico.

Sobravam empregos e podíamos escolher. A fartura era grande e o Brasil crescia como nunca. A Amazônia e o Centro Oeste entraram na rota do desenvolvimento, alavancados por financiamentos de longo prazo e juro barato. “A Amazônia é nossa”, “Integrar para não entregar”, - eram alguns dos slogans da época.

Com meu espírito aventureiro, curioso e desbravador fiz a opção por trabalhar nesta exuberante região.  Ali onde o filho chora, a mãe sabe, e pior - não pode fazer nada. Eram quase quatro mil km de distância entre a minha pequenina Ibaté e Belém do Pará, onde fui morar. Por sinal, uma bela e grande cidade, cercada pela imensa baía de Guajará. Suas ruas arborizadas com frondosas mangueiras são famosas, bem como sua rica e centenária arquitetura edificada nos tempos áureos do ciclo da borracha.  Tudo isso lhe confere o status de um dos mais belos cartões postais do Brasil.

A minha contratação foi uma piada, além de conhecer mal São Paulo - sede da empresa contratante – eu não tinha roupas à altura do “trampo”. Para começar, emprestei um terno do meu grande amigo Nédson Fraige mais conhecido por “Conde”. Na época, um brilhante advogado. Que Deus o tenha! A propósito, a cidade ficou mais triste depois de sua partida.

O próximo mico foi gastar o tal fundo fixo – adiantamento para despesas de viagem – para comprar roupas na Rua José Paulino - em São Paulo. Era lá onde a pobreza fazia a festa para rechear o guarda-roupa.  Minha mala de corvin, marrom, ficou bufando de tão cheia.

Quando meu chefe perguntou-me: - E daí, pronto pra viajar? Eu disse-lhe: - Estou pronto, só falta o dinheiro da viagem. - Mas você ainda não pegou seu fundo fixo?  – Peguei, mas comprei tudo em roupas. Quase fui demitido no primeiro dia, mas com ponderação e uma boa explicação, o chefe relevou o furo que eu havia cometido e me repôs o adiantamento - deve ter notado no meu jeitão de matuto ingênuo, alguma sinceridade.

O que eu mais queria era pegar o “Fusca” do meu sonho, aliás, o Fusca pertencia à empresa. Na ânsia de montar no amarelinho, viajar para o interior, mostrá-lo aos amigos e família esqueci de abastecê-lo, passando o maior sufoco na Avenida Paulista. Empurrá-lo até o posto de gasolina mais próximo, devido a uma “pane seca”, foi a única e estressante saída. Depois de amassar seu pára-choque e em seguida  a sua traseira, parti para Belém.

A longa viagem parecia uma eternidade. Foram quatro intermináveis dias e pelo retrovisor - via minha cidade, nosso sítio, minha família, meus amigos e um pedaço da minha história se distanciando cada vez mais. Minha forma de ver o mundo havia mudado para sempre! “Quem inventou a distância não conhecia a dor da saudade”. A ansiedade aumentava à medida que me aproximava do destino - tudo era novidade.  A riqueza das comidas do Norte, a diversidade de frutas exóticas, a exuberância da mata Amazônica, o costume do povo, o jeito de falar, o vai e vem de novos empreendedores, enfim, parecia que eu estava num outro país.

Após um ano longe da família, ter contraído duas malárias retornei de férias à terra onde nasci. Não sem antes capotar meu irreverente Fusca tendo como conseqüência - a perda total. Ah! Se meu “Fusca” falasse, certamente diria: - Valeu amigo, fomos fortes e vencemos, enquanto repousarei num ferro velho, você estará voando alto embalado nos sonhos de sua exuberante juventude.  

E VIVA BELÉM DO PARÁ!

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Osvaldo Piccinin

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