Sou um privilegiado por ter vivido as épocas de ouro do maior movimento musical dos últimos cinquenta anos. Vivi a Bossa Nova, MPB, a Beatlemania e principalmente a fase que marcou de forma muito forte minha adolescência e juventude – A Jovem Guarda, liderada pelo eterno romântico - Roberto Carlos.
Ainda no tempo da Sonata, movida a oito pilhas Ray-O-Vac, nos reuníamos cada vez na casa de um amigo para ouvirmos as músicas do Rei, nas tardes de domingo. Todo final de ano, era lançado um novo disco. Eu nunca dei conta de comprar um, pelo menos. Primeiro porque era um durango; segundo, porque nem Sonata eu tinha. A casa dos amigos era a melhor opção!
Conheço quase todas suas músicas e também parte de sua história. Dancei em vários bailes do interior e em várias brincadeiras dançantes, aos sábados à noite, quase sempre de rostinho colado deixando que o Rei falasse por mim: “Eu te amo, eu te amo”. “Detalhes tão pequenos de nós dois, são coisas muito grandes pra esquecer”...
Nossa diferença de idade é de apenas dez aninhos, ou seja, quando comecei a ouvi-lo ele tinha vinte e cinco e fazendo um tremendo sucesso. Eu cheio, de amor pra dar, tornei- me fã. Cabeludo e metido numa calça “boca de sino”, eu era uma brasa mora! “E que tudo mais, vá pro inferno”!.
Gostava tanto de suas músicas, que sonhava um dia conhecê-lo pessoalmente e dizer isso a ele. Tentei aprender a tocar violão e a compor, também por conta disso, mas aí amigo, faltou talento e carisma. Achei mais conveniente fazer uma faculdade e garantir meu futuro de outra maneira. Ainda bem!
Anos depois, morando no Rio de Janeiro, conheci sua cidade natal, eternizada em outra linda canção - Meu Pequeno Cachoeiro. “Eu passo a vida recordando, de tudo quanto aí deixei Cachoeiro, Cachoeiro vim pro Rio de Janeiro, pra voltar e não voltei”. “Meu pequeno Cachoeiro, vivo só pensando em ti, ai que saudade dessas terras, entre as serras, doce terra onde eu nasci”. Além de tudo um poeta supersensível!
Cidade de médio porte localizada no Estado do Espírito Santo é cortada pelo rio Itapemirim e rodeada de montanhas. Longe de ser uma bela cidade, mas se torna bucólica pelo fato de guardar em seu seio, recordações e parte da história de seu filho mais ilustre.
Lá conheci o local onde, ele, ainda uma criança, teve parte de sua perna decepada pelo trem, quando brincava ingenuamente sobre seus trilhos. Conheci sua humilde casa, onde sua mãe - Lady Laura, também eternizada numa canção - eximia costureira - vivia com o esposo- relojoeiro - e mais quatro filhos. Casa esta, transformada em museu. “Me leve pra casa Lady Laura, me faça dormir Lady Laura”...
Enfim quis o destino que meu sonho de adolescente se tornasse quase realidade, eu estava sentido as pegadas do Rei, mas ainda não havia cruzado seu caminho pessoalmente. Sentia-me orgulhoso e contava esta experiência de conhecer seu berço - Cachoeiro de Itapemirim, para Deus e o mundo.
O mais incrível ainda estava por acontecer. Eu continuava sonhando com este dia. Numa viagem de São Paulo ao Rio de Janeiro o que parecia impossível, aconteceu. Já acomodado em minha poltrona, no antigo avião Electra, notei que o único lugar disponível era o de número dezoito, ao meu lado. Coisa rara, neste voo sempre lotado.
De repente, vejo a figura de Roberto Carlos caminhando pelo corredor e vindo em direção à poltrona vazia. Ganhei o dia, pensei! Hoje finalmente poderei dizer a ele o quanto foi importante em minha juventude e da minha admiração pelo seu talento e carisma.
Educadamente pediu licença e sentou-se. Não dei a mínima moral para o cara. Até parecia que o Rei era eu. Concentrei-me e imaginei fazer perguntas inteligentes para não ser inconveniente e nem parecer um babaca do tipo, “baba ovo”.
Após dez minutos da decolagem, me virei subitamente para iniciar o diálogo. Sabe o que eu vi? O Rei estava em sono profundo. Que decepção! E agora? Perguntei-me. Esnobei o cara e perdi a única chance de minha vida. A de conversar com meu ídolo Roberto Carlos, um sonho tão sonhado!
E VIVA O REI ROBERTO CARLOS!
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