20/02/2023
TAPACHULA - 3ª parte

Tapa - Chula

Esta é a terceira crônica sobre minhas andanças pelo continente americano. 

Então, se você não leu as duas primeiras, dê um click no meu nome na primeira página e escolha  “Mudando para o México, destino Tapachula” e “Ainda em Tapachula".

Recebi noticias da curiosidade de leitores sobre este paraíso no sudoeste mexicano e, decidi antes de seguir viagem apresentar formalmente a verdadeira “chula” latina = Tapachula.

Tapachula significa em língua “Nahuatl”: lugar inundável, em função das constantes chuvas e presença de rios.

O povo originário daí eram os maias, e hoje  existem apenas fragmentos da tradição “mana” que  foi calada no decorrer dos séculos, sobretudo pela colonização espanhola.

Conhecida como "Pérola do Soconusco”, está na região mais rica do México em termos de biodiversidade. Entre montanhas e o mar Pacifico, a flora e fauna são surpreendentes.

Com 354 mil habitantes, é a cidade mais povoada do estado mexicano de Chiapas.

É aqui que as coisas tomam um ar intrigante! A mais povoada? Trata-se de um território de 303 quilômetros quadrados! 

Pois bem, não podia ser diferente uma vez que no decorrer da história da humanidade, nada atraiu e atrai tanta atenção como a “chula”. 

Sendo assim, é fácil imaginar que a maior parte da população desta erotica cidade fronteiriça é de origem mestiça não hispana! O que em poucas palavras significa "diversidade de chula”.

Atraídos pelas histórias das riquezas naturais e das terras de solo extremamente fertil, extrangeiros de longinquos nascedouros, impulsionados pelo proprio governo mexicano, empreenderam marcha, remo, tico-tico até  este exotico lugar.

A maioria dos tapachulecos possuem ao menos uma origem ancestral, em suas árvores genealógicas de chineses, japoneses, libaneses, sírios, iraquianos e principalmente de alemães. 

Um fato interessante é que estas comunidades embora tenham entrado na “chula” de coração aberto, e sejam responsáveis pela heterogeneidade cultural, elas estão fechadas em seu círculo social. Ou seja, você verá descendentes de alemães (por exemplo)  pelas ruas, mas eles vivem nos lugares ocupados por seus ascendentes, a maior parcela em fincas de café.

Contam os herdeiros dos herdeiros que não foi difícil a adaptação de seus antecessores por aquelas terras úmidas! “Chula” abriu caminhos prazerosos, entusiasmando a criação de inúmeras fazendas “chulenses”!

E a saga continuou…senhores apoderados de outros continentes encorajados pelos contos de “chula” (s) arriscaram largas viagens a terra prometida das perdições e  “Tapa a Chula”, ops Tapachula, foi palco da primeira imigracao de japoneses para a América Latina, que desembarcou nada mais, nada menos que no porto de “San Benito”, recepcionados com frutas típicas agarradas as “chulas”.

Passado o período de intoxicação pelas beldades “chulenses”, era o momento de aprofundar as relações diplomáticas. E em 1998, em comemoração ao bicentenário das relações entre “Chula” e Japão, o então, príncipe Akshino, inaugurou “in persona”, na terra da “chula”, “La Casa de la Cultura Japonesa”. 

Há quem diga que aí, existem túneis secretos  que conduzem para  acomodações vultuosas (molhadinhas), onde pequenos bastões mágicos japoneses transformam “chula” em gueixas!

Ainda que pese o “boca a boca” de que os desejos nipônicos sejam inclinados a intensa e contínua atividade, a verdade é que o feromônio expelido por chula continua capturando andarilhos do mundo afora. 

A tradicional comida tapachulenha é a suculenta sopa chinesa de pato! 

A gastronomia e a arquitetura representam influência massiva dos chineses, prova inconteste do orgasmo cultural nos tatames! 

No entanto, não é apenas de café e comidas exóticas que vivem os “chulenses”.

O verdadeiro erário daquelas terras é o antiquíssimo cacao. 

Considerado o “ouro” da região, os rituais dedicados ao cacao são conhecidos e procurados por quem quer imergir na cultura mais remota do lugar.

O cacau nativo é consumido também como "água de cacau”, vendido em saquinhos. Não se intimide pelo tamanho, textura e aparência, todos sacos são produzidos sob rígidas regras do Ministério da Saúde de “chula”.

Ainda que pese a multiplicidade de “chulas”, o produto mais exportado de Tapachula é a banana. E não pense que estamos falando de uma simples banana.

A banana é da nossa queridíssima “Chiquita bacana”, Carmem Miranda, uma portuguesa radicada no……….Brasil!

Parece um emaranhado de coincidências. “Chula”, cacau e banana. Mas não é! Agora você entenderá o mistério de Tapachula.

O esporte mais praticado pelos chulenses é a pica. E se você nunca praticou pica, Tapa na “chula” e se joga, porque vai picar até “enchilar”.

É comum que na primeira vez, o escolhido sinta náuseas, dores abdominais intensas, sensação de falência, amortecimento da língua, vermelhidão nos olhos e engasgue. 

Mas um bom gole de Tequila resolve a quase morte.

Você já sabe a origem de “Tapa”, o que deve ou não “comer”. Onde ir?

Faça a rota do café pela carretera “Tapachula - Nueva Alemania”. Embora chova o ano todo, o caminho de pedras é bem conhecido pelos guias locais. Na finca Hamburgo é possível ver a costa do pacifico e um aglomerado de montanhas deslumbrantes.

Visite a Igreja de “San Agostin” que apesar de estar muito deteriorada em função dos terremotos, tem um teto talhado em madeira linda e é enfeitada com flores exóticas da região.

Va a “Puerto Madero”, um dos maiores portos de recepção de cruzeiros no México.

E se quiser entender a origem do termo “engodo imobiliario”, conheça “Playa Linda”.

Para quem curte esportes radicais, o vulcão Takana é o mais procurado para escaladas. 

Na fronteira com a Guatemala, está a 4000 metros de altitude e são necessários dois dias para chegar no topo.

Caso você não tenha o abdômen do Super Homem, as pernas e braços do Homem Aranha, e o fôlego do Aquaman, olhe para o horizonte e de qualquer ângulo de “Tapa” na “chula”, é possível ver o vulcão.

Fica a dica: se cansou da aguaceira de “chula” nas fazendas de café, dá um pulo no TA - KA - LA, ops Takana.  

Conheça a Zona Arqueológica de Izapa, desde que não espere encontrar uma pirâmide de verdade, porque o que verá são escadinhas com pirâmides de 2, 3 metros de altura. O impressionante ali é o alinhamento com as montanhas, sol, estrelas. 

Inclusive no ano de 2000 houve um alinhamento de planetas e  um dos melhores lugares do mundo para se ver foi nas ruínas de Izapa.

Deixo a observação de que a cultura de Tapachula e região é de extensão muito mais abrangente do que comento aqui. 

Um ambiente onde a natureza brota por todos os lados, a mescla entre místico, excêntricos, natural, a porta de um lugar mágico.

Atrai o turismo alternativo, ecoturismo e arqueológico.

Curiosidade: há no território uma planta chamada “Pinon de Leche”, que além de servir como remédio para cura de diferentes enfermidades, de suas sementes é possível extrair um azeite para ser usado como biodiesel.

Outra folha muito conhecida é o “chipilin” aproveitado principalmente na culinária para pratos exóticos.

 

E perto do fim, deixo algumas dicas de sobrevivência na terra da “chula”.

1 Não coma nada antes de perguntar se “pica”. A pimenta tapachulense não é para amador.

2 Não aceite qualquer banana. Peca pela banana da “Chiquita Bacana”. Do contrário a banana servida será banana-pica.

3 caso tenha alergia a picantes ou picadura, peca por água de cacau (substituto natural para quem gosta de “chula” e pica mas  encontra-se em abstinência )

4 em nenhuma hipótese durma desnudo.  Em Tapachula já são comercializados pijamas desenvolvidos pela Nasa que suportam o calor expelido pelos vulcões em erupção, servem como boia em caso de Tsunami, e mantém o labirinto equilibrado em caso de terremoto. 

5 busque pelas “massarocas” em caso de picaduras. Tapachula não perdoa traição, e em terra tropical tem que ter dengue e chikungunya. 

Atualmente, Tapachula é o início das jornadas de imigracao de países, sobretudo da América Central e África aos EUA. 

Pessoas fugindo da fome, situações de perseguição política, catástrofes, calamidades sócio-econômicas de seus países, ou mesmo buscando seus sonhos, encontram refúgio nestas terras. 

No início da pandemia, uma tímida mídia mexicana expôs a situação insalubre de africanos que esperavam respostas às suas petições, abarrotados nos becos e em praças no centro da cidade. 

Gostaria de aprofundar neste tema, mas deixarei para outra ocasião!

Por hora quero contar minha superficial experiência neste âmbito em Tapachula.

A última vez que estive lá, conheci uma família de três pessoas (mãe, pai, filha), vivendo num sítio como “caseiros” em troca de um cômodo para dormir.  

A menina de 11 anos não havia ido à escola, não tinha lápis, papel, brinquedo de cidade e seu maior sonho era aprender a ler e escrever! Ela mostrou com entusiasmo que dividia sua “cama” com gatinhos que resgatou!

Fiquei perplexa com tanta simplicidade naqueles olhares, na maneira despretensiosa que perguntavam sobre minha vida, e tive vergonha de contar de onde eu era, onde eu vivia.

Meses depois recebi a notícia que a Imigracao Americana havia concedido refúgio para os três.

Bom fim de carnaval para vocês e cuidem das “chulas” e “picas”!

Daniele de Cassia Rotundo

 

N.R, Como explicado pela Colunista e em resposta a vários emails de leitores deste Jornal, tapachula é uma cidade do México e não uma espécie de biquini. 

 



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