As lixeiras estão abarrotadas de papel, o mesmo papel que comprou dois dias atrás.
Os vizinhos não colocaram as caixas de presente no lixo reciclável e não tem espaço para as sobras do leitão e para a farofa de banana que sua sogra fez.
Acabou a comilança, o bucho está bem estufadinho, e a dor de cabeça não passou nem com folha de boldo amassada.
Ainda está escutando o zumbido do brinquedo insuportável que sua irmã deu para o sobrinho.
Todos copos espalhados pela casa. Os de cristal que você ganhou do padrinho de casamento, os que eram de sua avó, também aqueles de plástico da Tupperware que sua mãe deu para não emprestar os dela, e até os de requeijão.
As travessas dos anos 500 não encaixam de volta no armário.
A toalha já está de molho no ácido? Aquela regurgitada que sua cunhada hipocondríaca deu será difícil de sair.
Já contou qual a baixa de talheres? Se este ano sumiram somente garfos, talvez fique o mesmo número que as colheres que sobraram do ano passado.
Sobrou panetone?
Por um tempo escondia este prazer do “dia seguinte”.
Mas os anos passam, o peru é o mesmo, e a liberdade de expressão pede passagem: é impagável a sensação de ter passado pela prova.
O exame que antecede o final. Aquele que não tem como fugir sem deixar rastros “ad eternum” pela desfeita ao “dever” de celebrar.
A gente passa onze meses esperando o fim de ano, a semana mais desgastante para qualquer “pilota de fogão”, e quando ele chega a vontade que dá é esconder-se na Lapônia.
É um pesadelo que dura mês: tem o encontro da turma do trabalho com o chefe carrasco que você não suporta mas abracara agradecendo pelo ano maravilhoso, o amigo secreto dos iluminados yoguis que você sempre tira a mocreia do tapetinho do lado, e sem menor importância, as apresentações de conclusão de cursos.
E se não comparecer : além da falta, é reprovado sumariamente, em sentença condenatória do STJ.
Eu e meu marido fomos convidados para o “Jantar de fim de ano”, no escritório de Dallas, pela primeira vez em cinco anos. Estavamos lotados de coisas para fazer (aquelas que só aparecem no bendito FDA), que chegamos um dia antes da festa sem roupa e sem hotel. Embora eu tenha conseguido ir a manicure (num dia péssimo, com enxaqueca) colocar unha postiça para o evento (um horror, ficou grande demais, arranhei tudo e todos, incluindo a mim, caiu e a cola em gel destruiu o que sobrou na minha unha) !
A festa? Breguíssima, num hotel "chiquérrimo", no salao medieval , escuro, fétido e apertado. A comida? Saímos para jantar depois, isto responde.
Enfim, foi uma merda.
Mas passamos no teste.
Meu voto é que FDA (fim de ano) sirva para dormir.
Você está exausto do ano FDP, cheio de contas - imprevisto, que não estavam programadas no Excel, com um calor dos infernos (no Brasil, porque aqui nos EUA estamos congelando). E o que um ser ordinário pode querer? Sonoterapia!
Mas não. É o oposto que acontece.
O povo frita na praia, na piscina, na laje, na grama para colocar “decote profundo”, cria evidências que gasta mais do que pode e enche a cara enquanto come pelos onze de dieta.
Eu preferia mesmo fingir demência e acordar dois de janeiro, sem os quilos a mais e a conta estourada.
É difícil assumir que esta época é um porre a seco !
Temos que ... .temos que ...montar a árvore de Natal que serve de abrigo para os ácaros, comprar mais vinte bolas vermelhas, dez prateadas, cinco verdes (não pode repetir decoração), cantar música natalina, tirar a foto familia, foto com papai noel, sem falar da tão esperada convivência no dia D. O namorado da sobrinha adora camiseta regata, mais um ano comendo com chumaço de pelo pulando no prato. O cachorro da tia louca ficou transando mais um ano com a perna da tia solteirona. Os filhos da senhora do quarto andar jogaram a toalhinha de mão na privada.
Enfim, 26 de dezembro.
Acabou, por fim, não aguentava mais.
Eu que normalmente uso dez palavras para descrever o que outros fazem com cinco, hoje entrego apenas quatro.
Feliz 26 de dezembro para você que passará o resto da semana desencardindo a casa!
Daniele de Cassia Rotundo