Lá no extinto Bairro da Fábrica da Indústria Melhoramentos de Papel de Caieiras existiu um local afastado onde era frequentado por pescadores e ás vezes por famílias que lá, aos domingos iam para um pic-nic. O local conhecido como “A Represa” era uma pequena hidrelétrica com capacidade para gerar 3.000 volts e fora construída para movimentar a terceira máquina de papel da indústria inaugurada em 1912. Do lado daquela represa do Rio Juquery existiam duas casas para três famílias. Na casa com repartições para abrigar duas famílias uma delas era a do Senhor Adolfo que era pai do Mario Aurélio de Campos casado com a Tica Camargo. A filha dele era casada com o Luiz da Silva conhecido como Luiz Eletricista. Noutra casa morava o casal Alfredo e Dona Margarida Bobbia Streuli com os filhos Ângelo e Alberto Streuli. Os “chefes” de família daquelas casas eram responsáveis pelo funcionamento e manutenção da hidrelétrica. O Senhor Alfredo conhecido como “o alemão da represa” era suíço e não alemão. Em suas horas de folga dedicava-se a apicultura. Possuía nas matas ao derredor de sua casa cerca de vinte e cinco caixas de abelhas de donde extraia mel. Do outro lado do rio e da represa existiam os trilhos da Estrada de Ferro Perus a Pirapora da Cia. de Cimento do Bairro de Perus. Ás vezes lá estando se via e se ouvia o apito da pequena Maria Fumaça rumo ao local de nome Gato Preto e depois ao local de nome Água Fria, antes de se chamar Cajamar, onde era o final do trajeto do trenzinho, que, nunca se estendeu até a cidadezinha de Pirapora. Quando trabalhei no laboratório da Indústria Melhoramentos de Papel, uma vez por mês me era requisitado um jipe com motorista para que eu fosse até a represa colher amostra de água para analisar e como eu gostava disso. O trajeto depois da então conhecida Vila Leão, se percorrido a pé pelo local desabitado era longo entre matas e para lá chegar demandava um tempo de cerca de meia hora. Entretanto, lá estando se sentia como se estivesse num outro mundo ou em outro país, como um local muito antigo parecido como um daqueles vistos em filmes. Contornando-se o prédio da usina hidrelétrica, por detrás dela a descida era bem íngreme até se chegar à margem do rio onde era o local preferido para se pescar, pois, era onde mais se pescava lambaris. Havia muitas na proximidade do paredão da represa ainda mais quando as águas represadas do rio de cima desaguavam no rio de baixo. Os entulhos de pedras da construção da barragem foram espalhados num dos lados do rio calçando assim sua margem do lado pertencente à Indústria Melhoramentos. Nas muitas pedras sobrepostas os pescadores se sentavam e tinham como apoiar suas varas de pescar. Ás vezes da fábrica de papel, distante cinco quilômetros da represa, alguns mecânicos e eletricistas vinham para uma manutenção da hidrelétrica e entre eles o da época, muito conhecido Riciere Marim. Um jipe os levava na parte da manhã e os ia buscar no fim da tarde. Numa dessas vezes, tendo terminada a manutenção, o Riciere ficou perambulando por lá. Depois que o jipe veio para transportar de volta aqueles encarregados da manutenção da hidrelétrica, o Senhor Alfredo Streuli notou a falta de um cacho de banana maçã quase amadurecido que estava dependurado numa das bananeiras do seu quintal. Aquele cacho de bananas maçã estava sendo reservado para o seu filho Ângelo ainda criança, que, por aconselhamento médico precisava se alimentar delas para sanar um problema de saúde. Ao telefonar da represa para a fábrica de papel e falar com um dos responsáveis pelo setor elétrico da indústria, o Senhor Alfredo ficou sabendo que o Riciere Marim havia escondido no mato o cacho de bananas e no retorno para o Bairro da Fábrica, ao passar por onde estava o cacho de bananas pediu para o motorista parar o jipe para recolhê-lo. O Senhor Alfredo exigiu a devolução do cacho de bananas e o Riciere teve mesmo que devolver. Mas, percorreu o trajeto até a represa a pé carregando o cacho de bananas para devolvê-lo. Como prêmio ou castigo, ganhou do Senhor Alfredo um enorme cacho de bananas nanicas e o carregando, pesado como era, retornou novamente a pé os cinco quilômetros que o separavam de sua casa. Talvez, por esta e outras histórias diziam que o Senhor Alfredo era “invocado”. Parecia não gostar da presença de pessoas pelas imediações da represa e nem de pescadores, mas, não era verdade. Apenas seguia “á risca” as ordens que tinha para proteger aquele patrimônio de estranhos que, pela curiosidade sobre o local poderiam interferir no funcionamento daquela usina de força. Por dois anos antes da hidrelétrica da “represa” ser desativada, o filho do Senhor Alfredo, o Ângelo, ele ficou sendo responsável pelo funcionamento dela até o ano de 1972, quando deixou de ser funcionário da Indústria Melhoramentos. Logo depois da ausência do Ângelo foi encerrada a atividade da hidrelétrica, que, tendo todo seu maquinário desmontado fora transportada para a Fazenda Levantina de Camanducaia, Minas Gerais, também propriedade da Indústria Melhoramentos. Informação esta, recentemente dada pelo Ângelo. E assim, teve fim um local histórico do agora Município de Caieiras. Quando da partida para sempre das pessoas remanescentes daquela época, ninguém mais se lembrará ou saberá da existência daquele recanto tão agradável e distante das conturbações humanas dos lugares mais habitados. Os proprietários da indústria local não se preocuparam em preservar tradições, fatos e histórias para a posteridade do povo local e ninguém do local se importou com isso. Tendo sido assim conto-lhes uma história parecida agora com história de pescador. Era uma vez, quando existiu uma represa num lugar aprazível aonde se ia para pescar e também para passear. O viver era mais extrovertido, as amizades eram mais autênticas e estando lá na represa ela parecia refletir a tranqüilidade e a moralidade daquela época. Lá morava o alemão da represa e ele...
Altino Olympio
Comentários
Olá Altino, Desejo-lhe um ótimo e Feliz Ano
Sobre o texto da represa eu adorei. Minha adolescência foi praticamente toda vivida nessa represa, eu ia praticamente todos os dias para lá e passava o dia com a Família Streuli. Acredito que o Ângelo há essa altura do campeonato deve estar ficando gagá. Muita parte da história está correta, mas muita coisa foi mudada por ele nesse relato sobre a vivência na represa. Sobre a pequena hidroelétrica, ela gerava 6.000 Volts e não 3.000 Volts e sua capacidade eram de 150 Kwa. Realmente ela foi feita para movimentar a 3ª máquina de papel, na realidade essa máquina preparava a celulose. Muitas vezes quando a Cesp não fornecia energia para a fábrica essa usina era acionada e alimentava também toda a Vila Leão. Posso estar enganado, mas pelo que sei o Sr. Alfredo Hans Streuli era alemão sim, sua esposa Dna. Margarida Bobbia Streuli era suíça. Infelizmente Sr. Alfredo veio a falecer em um exame de endoscopia no Hospital dos Servidores em Jundiai, mais recentemente faleceu também Dona Margarida. Sobre a apicultura a história do Ângelo está correta, realmente eram 25 caixas de abelhas e ficava do outro lado do rio, lembro-me que ele cercou toda sua criação de abelhas produtoras e comprou uns 30 metros de fio esticando esse fio das caixas de abelhas até sua residência e fez um sistema de alarme para não ser roubado. Inclusive muitos e muitos anos apos toda a demolição da usina e das casas, eu e meu sobrinho Lincoln fomos de bicicleta para aqueles lados em forma de lembranças do local. Lembrei-me do fio e da posição em que foi passado, foi só escavar uns 20 cm de terra e encontrei o danado do fio que Sr. Alfredo havia instalado lá, provavelmente ainda deve estar por lá. Realmente o SR. Alfredo mantinha uma horta para seu abastecimento alimentar, tinha muitas bananeiras, mas nunca fiquei sabendo dessa história da banana maçã. Realmente o Ângelo ocupou o lugar do pai como usineiro, eu lembro-me muito bem que quando a MD Nicolau comprou uma parte da fazenda o Ângelo optou por ser demitido da Ind. Melhoramentos e admitido pela MD Nicolau tendo assim um salário mais elevado. Em 1972 ele sai definitivamente da função. Pelo que sei essa usina foi desativada, desmontada e foi vendida para um japonês que era do sul do país, não me lembro agora se era do Paraná ou Rio Grande do Sul. Que eu saiba essa usina nunca foi para a Fazenda Levantina. Outro detalhe muito interessante era que Sr. Alfredo mantinha uma caixa especial e uma grande vara com forquilha na ponta para pegar as cobras que apareciam por lá e as enviava ao Instituto Butantã, para que fosse retirado o veneno e posteriormente fabricar o antídoto. O Sr. Alfredo tinha uma doença rara por conta da química usada para fazer o papel que ficava no rio, com a queda da água nas barragens se formava uma brisa e o vento acabava trazendo essa brisa para as casas. O Sr. Alfredo precisava fazer sempre o exame de BCG e como eu frequentava sua casa e comia lá também eu fui obrigado a fazer todo o ano esse exame, que na realidade era uma vacina de BCG, coisa desse tipo. Para mim sempre deu negativo, menos mal. Mas tenho uma parte de minha vida vivida nessa represa e na Vila Leão, assim como pelas redondezas.
Mas em suma adorei a história, vou até guardá-la aqui na HD
Um forte abraço
Delmonte Vicêncio