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Grupo Escolar Alfredo Weiszflog

Grupo Escolar Alfredo Weiszflog

Ano de 1952. Acordei pelo chamado de minha mãe. É hora de ir pra escola. Que bom, faz tempo que não urino na cama. Vou me vestir com a camisa branca e a bonita calça curta de brim azul que foi costurada pela Dona Bruna Caresato, esposa do Senhor Hilário. Já abri a janela e o sol entrou trazendo claridade. Como acontecem todas as manhãs estou no mundo outra vez. Agora aqui na sala sempre paro para dar uma olhada na cristaleira. Suas portas são de vidro transparente e tudo por dentro é visível. Ah, o relógio de pulso de cor preta que tanto admiro. Mexer nele? Nem pensar, se mexer e o pai o souber fica bravo comigo. E essa foto, por que está aqui? O pai diz que é do Benito Mussolini, um italiano. Hum... Mas que cheiro de café. De ovo frito também e é para o lanche que vou levar pra escola. Xi, a mãe está brava hoje. O gato amarelo cego de um olho outra vez abriu a porta da dispensa da cozinha e roubou algum alimento. Já tomei café com leite e comi pão de ontem com manteiga. O Lulu esteve sentado ao meu lado com aquela carinha de fazer dó. Impaciente, ele se levantou até minhas pernas e ficou raspando as patas nas minhas cochas para pedir pão com manteiga e eu dei. O rádio na sala já está ligado e o som dele chega até aqui na cozinha. Neste ano, no dia 27 de setembro morreu Francisco Alves, o rei da voz. Nunca tinha visto tanta choradeira por alguém que morreu. Ele era um cantor muito querido. Já estou a caminho da escola e hoje como estou atrasado não posso atirar pedras ao rio. Vou andar mais depressa senão chego lá depois do soar da campainha de chamada quando os alunos de cada classe ficam em fila de dois a dois para adentrar na escola. Se chegar depois disso e o diretor, Senhor Luiz Tadley me ver, com certeza vai me dar um puxão de orelhas doído. Ah que bom, cheguei a tempo. Já estou na fila dos alunos do quarto ano e adentrando. Aqui a esquerda é a sala da secretaria e a direita a sala da diretoria. De ambos os lados desta escada tem grandes vasos de flores e são os amores do diretor. À esquerda tem um busto também. De quem será? Deve ser do alemão Alfredo Weiszflog. Aqui depois da escada de poucos degraus é o longo corredor, sempre muito limpo. À esquerda estão duas salas de aula e à direita mais duas, são quatro ao todo. Pronto, todos já entramos na sala do quarto ano da professora Silvia Brondy. O último a entrar fechou a porta deixando o mundo lá fora. Todos já se acomodaram em seus lugares de sempre nos bancos das carteiras. São três fileiras delas. A primeira é ao lado da porta de entrada, a segunda é a do meio e a terceira perto da parede com vidraças ao alto. Estou aqui na primeira carteira da primeira fila delas. Meu companheiro de carteira é o meu primo Zinho (José Olimpio). Não estamos aqui na primeira carteira e bem próximo da professora porque somos os mais bonitinhos da classe. Não. É porque somos bagunceiros demais e a Dona Silvia, aqui nos vigia melhor. Aconteceu uma vez quando ela estava encostada na escrivaninha, de frente para os alunos explicando melhor o “ponto” (a lição) que ela havia escrito na lousa e duas moscas, uma sobre a outra fazendo porcaria pousaram no meu braço. O Zinho viu e não se conteve: Uia, uia, uia, ele falou alto. Espontânea a nossa alta gargalhada interrompeu a seriedade do momento. Tentamos tossir para disfarçar o riso, mas não deu certo. Algum silêncio se fez e a seguir a Dona Silvia voltou a dominar o recinto com frases que nada tinham a ver com a lição. “Eu detesto quando estou explicando a lição (e foi se aproximando) e esses moleques malcriados me interrompem”. Que tapa que ela me deu na face esquerda do rosto. Foi tão forte que um zumbido no ouvido perdurou por muito tempo. Tapa igual o Zinho também ganhou e como eu, jamais ele esquecerá. A seguir ela nos mandou ficar de castigo fora da classe lá no corredor. Sorte que o diretor não nos viu, senão... Seríamos puxados pelas orelhas e gemendo de dor até a sala dele e teríamos que ouvi-lo reclamar “amolação, amolação, amolação”. Mas, estando na primeira carteira eu tenho dificuldade de olhar para as meninas da fileira do meio. É preciso olhar para trás e evitar que a Dona Silvia perceba. As meninas são tão bem arrumadinhas, limpinhas, e nós, os meninos, não. Vários estão descalços e alguns até com os pés encardidos de poeira. Olhando pras meninas se sente um complexo de inferioridade. São comportadinhas ao contrário dos meninos. E quem são elas? Vani da Fonseca Valbuza, minha vizinha. Reni Boscheto, Arlete Massimeli, Harue Sato, Suzana, a filha do alemão Senhor Henrique Dick, aquele que se parece com o mocinho dos filmes de faroeste, o Randolf Scot. Continuando, Elga Raquel, Jandira Albino, Elenice Albino, Aparecida Furquim, Egna Mussolini, Alair Lucieto, Aríete Vieira, Vilma de Freitas, Guiomar Fernandes, Dulce Miranda, Diva Marchesini, Tereza, aquela que mora com a família do Sr. Dick e outras que agora esqueci seus nomes. Agora os meninos: Meu primo Zinho, Toninho de Pádua, Rafael de Grande (o Chaque), Euclides dos Santos (o Clidão), Leovaldo Godói, Amador Capataz, Sebastião, o filho do Senhor Lazinho e outros que agora me fugiu os seus nomes. Opa, hora do recreio. Hora também de se misturar com as meninas e os meninos do terceiro e do segundo ano escolar. Aqui do lado direito da escola é este páteo plano com um galpão onde uns degraus compridos e altos servem de bancos onde a meninada se acomoda para lanchar. Fica próximo aos banheiros. As meninas mais só conversam entre elas e os meninos depois de lancharem se espalham pelo páteo, um corre pra cá, outro corre pra lá e seus alaridos se misturam. Alguns meninos tão simples usam calça curta feita em casa e com o mesmo tecido dela são os seus suspensórios. Como suas calças são folgadas na cintura, quem se aproxima pode ver os seus bigolins. Algumas das meninas, talvez, tenham visto (risos). Ah, aqui está o mastro da bandeira próximo a cerca viva de arbustos. Lá em baixo está a Rua do Bairro Chique, mas, esta cerca impede sua visão.  Agora passei pela escada de acesso a escola e estou entre umas plantas ornamentais esparsas que formam um tímido jardim. Aquele abrigo lá perto da divisa com a casa do Fiore Gabrieli parece um coreto de banda. Lembro-me de quando os alunos e seus familiares foram intimados a vir aqui. Deram-nos umas bolinhas de óleo (óleo de rícino ou óleo de mamona) para engoli-las com água. Eram para nos livrar dos vermes. E depois disso foi uma correria para o banheiro e como diziam, para “distripar o mico”. Isso quer dizer, ir repetidas vezes ao banheiro ouvindo o ruído provocado por longos esguichos liquefeitos provenientes dos intestinos. Quem tivesse lombrigas, elas fugiriam pelo mesmo canal. Terminou à hora do recreio. Vou voltar para a sala de aula. Aqui estou novamente. Agora vou prestar atenção ás lições. Está chegando o fim do ano. Em agosto completei dez anos de vida e com essa idade, em dezembro vou “tirar o meu diploma”. Logo vai soar a campainha para o fim das aulas. Restam alguns momentos. Meninas e meninos da minha vida. O destino nos reuniu nesta sala de aulas e tantos me foram os momentos de alegria que compartilhei com vocês. Professora Silvia Brondy. Em pensamento vou falar com você porque pessoalmente minha timidez não permite. Pra ti sou toda a gratidão e nunca vou esquecê-la. Memorizei bem seu rosto, seus trejeitos e até sua voz. Enquanto eu viver... Ah soou a campainha. Fim da aula de hoje. Um sentimento de satisfação vai me acompanhar até minha volta pra casa. Depois a tarde estará a me esperar para qualquer brincadeira que surgir e com outros garotos. Empinar papagaio no morro, rodar arco pela rua, jogar bola, jogo de botão, roubar banana e chupar cana da roça do Senhor Luiz Molinari, ir nadar na lagoa da Ponte Seca, catar pinhão... Não sei o que está a me esperar. Tanto faz, pois, tudo me alegra.

                                                                                                              Altino Olympio



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